*Por Coletivo de Comunicação MAM-PA

Em meio à pandemia que já matou mais de 440 mil brasileiros e brasileiras, mineradora Vale S.A. alcança o terceiro lugar no mercado global do setor, com valor de mercado de R$ 500 bilhões, segundo relatório de insustentabilidade lançado este ano pela Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale

Depois de 24 anos da privatização da mineradora Vale S.A., o povo brasileiro não tem nada a comemorar, como prometia o Programa Nacional de Desestatização (PND) que se iniciou no Governo de Fernando Collor de Mello, foi aprimorado durante o Governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e que permanece até os dias de hoje. Dizia trecho da cartilha “Privatização da Vale do Rio Doce”, lançada pelo governo federal:

“Sob gestão privada, sua capacidade (da Vale) de alavancar recursos será maior, viabilizando novas oportunidades lucrativas de investimento. Para o País, isso representará mais empregos e maior arrecadação de impostos”.

Na realidade, a privatização da Vale representou um decréscimo nos postos de trabalho – a redução foi de 2.112 postos em 1997 para 1.701, dois anos depois – e a arrecadação de impostos mencionada, ou outros tipos de taxações da exploração mineral, como a Compensação Financeira Pela Exploração Mineral (CFEM), é residual se comparada aos lucros da empresa, segundo informações do relatório de Insustentabilidade 2021. (ver gráfico abaixo)

O atual modelo da multinacional com sede no Brasil tem uma estrutura acionária que está distribuída, principalmente, entre empresas e grupos estrangeiros. “Mesmo a Vale sendo criação brasileira, o atual governo federal embalou um processo de transferência de ações para acionistas estrangeiros, o que beneficia grandes grupos de capital internacional, e esses grupos vão expandindo suas propriedades nessa estrutura acionária”, explica Tádzio Coelho, professor da Universidade Federal Viçosa (UFV).

A Vale S.A é a empresa que mais compartilha seus lucros com os acionistas, sendo líder na classificação em 2020

Portanto, a característica de uma mineradora com esse padrão acionário é voltar sua extração de recursos somente para o viés das demandas internacionais, em detrimento dos interesses das populações e comunidades que são afetadas pela atividade da mineração.

Crimes em MG e no PA

O crime da Vale em Mariana (MG) foi o maior desastre ambiental do Brasil. Ocorrido em cinco de novembro de 2015, afetou 3,2 milhões de pessoas que residiam na bacia do Rio Doce, gerou 11 milhões de toneladas de peixes mortos pela lama, sendo oito em Minas Gerais e três no Espírito Santo, e matou 19 pessoas, destruindo comunidades inteiras sem nunca ter tido uma reparação adequada.

Quatro anos depois, dessa vez em Brumadinho (MG), a Vale repetiu a dose no maior acidente trabalhista já registrado no Brasil. Resultado: 272 pessoas mortas. O rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão causou uma avalanche de lama de 12,7 milhões de metros cúbicos de rejeito de mineração, afetando diretamente 11 municípios, comprometendo a sobrevivência de milhares de pessoas e contaminando o Rio Paraopeba e o Rio São Francisco, percorrendo posteriormente mais de dois mil quilômetros até desaguar no Oceano Atlântico. “Essa sequência de crimes gerou na população uma espécie de ‘terrorismo de barragens’, que continua tirando pessoas de suas casas e dos seus territórios”, destaca Marta Freitas, coordenadora do Fórum Sindical e Popular de Saúde e Segurança do Trabalhador e da Trabalhadora de Minas Gerais (FSPSST-MG).

Já no município de Barcarena (PA), as atividades de mineração de alumínio pela Vale também ficaram marcadas por crimes. Em 2002, uma falha no sistema de transporte de coque (tipo de combustível derivado da hulha, que é o carvão betuminoso) para o complexo minerador derramou cerca de 100 quilos do produto no rio Pará.

Além disso, um vazamento de lama vermelha da bacia de rejeitos da Hydro Alunorte, a maior refinaria de alumina do mundo fora da China, atingiu 13 comunidades ribeirinhas, conforme denúncia do Dossiê Desastres da Mineração em Barcarena: Disputas no Território e Comunidades Atingidas, lançado em 2019 pela Universidade Federal do Pará (UFPA). “Esses grandes empreendimentos trouxeram crimes ambientais irreparáveis, como a poluição do rio Murucupi e do rio Pará, que praticamente estão mortos”, afirma Sandra Amorim, coordenadora Estadual do MAM.

Lama de lucros

Pode parecer desumano – e o é -, mas o lucro da mineradora Vale ganha potência com as tragédias que ela causa. Os crimes de rompimentos das barragens em Mariana e Brumadinho não impediram que a Vale fosse a primeira colocada em 2019, na classificação das 20 maiores empresas brasileiras com maior valor de mercado, com R$ 298 bilhões, segundo informações da própria empresa.

 

Em 2021, em meio à pandemia que já matou mais de 440 mil brasileiros e brasileiras, mineradora Vale S.A. alcança o terceiro lugar no mercado global do setor, com valor de mercado de R$ 500 bilhões, segundo relatório de insustentabilidade lançado este ano pela Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas pela Vale. “O extremo faturamento da empresa advém da política de classificação da atividade como essencial em plena pandemia, da falta de reparação aos atingidos e atingidas pelos crimes da mineradora, da desvalorização do real, da demanda por minério de ferro na qualidade que se encontra na mina S11D, em Carajás, e pelo valor do minério de ferro que vem tendo altas históricas nos seus preços”, conclui Tádzio.

Saiba mais sobre o crescimento do lucro da Vale, o processo de financeirização da mineradora, os impactos da essencialidade da mineração nos casos de Covid-19 e o relatório de insustentabilidade da empresa, lançado pela Articulação Internacional dos Atingidos e Atingidas da Vale, no podcast Radar Mineral, produzido pelo Coletivo de Comunicação Nacional do MAM: