MAM Nacional https://www.mamnacional.org.br Por um país soberano e sério, contra o saque dos nossos minérios! Fri, 01 Dec 2023 16:38:33 +0000 pt-BR hourly 1 https://www.mamnacional.org.br/files/2017/03/cropped-logo-mam-32x32.png MAM Nacional https://www.mamnacional.org.br 32 32 25 de Novembro – Dia Internacional da não-violência contra as mulheres – Mulheres e Mineração: cenário de exploração, violência e opressões https://www.mamnacional.org.br/2023/11/25/25-de-novembro-dia-internacional-da-nao-violencia-contra-as-mulheres-mulheres-e-mineracao-cenario-de-exploracao-violencia-e-opressoes/ https://www.mamnacional.org.br/2023/11/25/25-de-novembro-dia-internacional-da-nao-violencia-contra-as-mulheres-mulheres-e-mineracao-cenario-de-exploracao-violencia-e-opressoes/#respond Sat, 25 Nov 2023 21:26:44 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3828 Por: Kathiuça Bertollo Dia Internacional da Não-Violência contra as Mulheres A data, estabelecida durante o I Encontro Feminista Latino-Americano e do Caribe realizado em Bogotá, Colômbia, em 1981, foi criada em homenagem às irmãs Mirabal. Em 1999, esta data foi reconhecida pela ONU como um dia internacional de luta. As Irmãs Mirabal: Pátria, Minerva e Maria […]

O post 25 de Novembro – Dia Internacional da não-violência contra as mulheres – Mulheres e Mineração: cenário de exploração, violência e opressões apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
Por: Kathiuça Bertollo

Dia Internacional da Não-Violência contra as Mulheres

A data, estabelecida durante o I Encontro Feminista Latino-Americano e do Caribe realizado em Bogotá, Colômbia, em 1981, foi criada em homenagem às irmãs Mirabal. Em 1999, esta data foi reconhecida pela ONU como um dia internacional de luta. As Irmãs Mirabal: Pátria, Minerva e Maria Teresa, também conhecidas como “Las Mariposas”, se destacaram no engajamento na luta política, contra uma das piores ditaduras da América Latina, liderada por Rafael Trujillo de 1930 a 1961, na República Dominicana.

O cenário de exploração, violência e opressões: retratos da sua incidência sobre as mulheres
O cotidiano das populações e comunidades que vivem no entorno dos complexos produtivos da mineração, próximo às barragens de rejeitos e aos complexos produtivos/minas é de destruição ambiental, violência e opressões.
Kathiuça Bertollo, Mestre e Doutora em Serviço Social pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e militante do MAM, analisa essas relações em seu artigo: Mulheres e mineração: o cenário das violências e das lutas na região do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais-Brasil.

Este texto explicita o cenário das violências e das lutas travadas pelas mulheres contra a mineração extrativista na região do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais – Brasil, território em que uma forte e potente atuação das mulheres ocorre historicamente. O objetivo desta reflexão é explicitar o contexto da luta de classes e como sua faceta violenta incide sobre as mulheres que possuem alguma relação com a mineração extrativista, seja como atingidas diretas, trabalhadoras desta atividade produtiva ou como parte de comunidades localizadas no entorno dos complexos produtivos e minas. Para tanto, o método assumido é o materialismo histórico-dialético e o percurso metodológico acontece a partir de pesquisa bibliográfica e documental organizada em dois âmbitos de reflexão: uma breve contextualização da mineração na região lócus do estudo a partir da condição de capitalismo dependente que se impõe e que a estrutura; em seguida, um retrato da realidade a partir de depoimentos e descrição de fatos que comprovam tal cenário. A constatação é de que a violência sobre as mulheres é estruturante e decorrente do atual modelo de mineração sustentado na superexploração da força de trabalho, no patriarcado, na misoginia, no machismo, no racismo e na destruição ambiental, e diante de tais determinantes as mulheres desencadeiam e assumem o protagonismo nas lutas sociais e resistências coletivas travadas historicamente nesta parte do vasto território latino-americano.

Introdução:

A relação ‘mulheres e mineração’ ocorre de diferentes formas. Há as trabalhadoras diretas e as terceirizadas nas mineradoras, que dispendem sua vida em prol da sobrevivência, e neste contexto são superexploradas e submetidas a condições de assédio e sexismo por chefias. Há as garimpeiras tradicionais que garantem o sustento familiar e lutam pela manutenção e preservação desse modo de vida e prática secular. Há as atingidas pelos rompimentos criminosos de barragens de rejeitos e pela destruição cotidiana que o processo produtivo desencadeia. Há as que vivenciam as dores, as perdas materiais e imateriais e o luto pela morte de entes queridos em decorrência do atual modelo de mineração, que é de acidentes e mortes. Há as mulheres estudantes, docentes e pesquisadoras, de diversas áreas do conhecimento, que se dedicam a estudar e compreender o contexto da extração mineral, colocando seus conhecimentos em prol dos territórios, comunidades e populações atingidas por esta atividade predatória. Há as lutadoras sociais que dedicam sua atuação à denúncia e ao enfrentamento à mineração extrativista, que lideram, coordenam e assumem protagonismo nos movimentos sociais, nas entidades sindicais, nas comunidades, nos coletivos populares, nos territórios.

A partir destas distintas posições e lugares ocupados, nas linhas seguintes, evidenciaremos aspectos do cenário de violências e das lutas travadas pelas mulheres contra a mineração extrativista na região do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais–Brasil, território em que uma forte e potente atuação das mulheres ocorre historicamente.

Para tanto, o método assumido é o materialismo histórico-dialético, em que se parte da apreensão da realidade concreta.

Alcançando a essência do objeto, isto é: capturando a sua estrutura e dinâmica, por meio de procedimentos analíticos e operando a sua síntese, o pesquisador a reproduz no plano do pensamento; mediante a pesquisa, viabilizada pelo método, o pesquisador reproduz, no plano ideal, a essência do objeto que investigou (Netto, 2011: 22).

Nessa esteira, o percurso metodológico acontece a partir de pesquisa bibliográfica e documental organizada em dois âmbitos de reflexão: uma breve contextualização da mineração na região lócus do estudo a partir da condição de capitalismo dependente que se impõe e que a estrutura; em seguida, um retrato da realidade a partir de depoimentos e descrição de fatos que comprovam tal cenário.

A mineração no quadrilátero ferrífero de Minas Gerais:

um contexto de destruição e morte

O continente latino-americano é marcado secularmente pelo saqueio, expropriação, exploração da força de trabalho e destruição dos bens naturais comuns. Karl Marx (2013), nas suas clássicas formulações, já explicitava o contexto que se impusera sobre este chão e suas gentes na constituição e conformação do capitalismo enquanto modo de produção de mercadorias e de reprodução social hegemônico no globo.

No bojo do capitalismo, a América Latina se conforma a partir da colonização e da exploração enquanto colônia europeia, da escravização secular dos povos originários e africanos, das relações de opressão de sexo e gênero, da inserção subordinada na divisão internacional do trabalho, da dependência econômica-política-cultural-social aos países de capitalismo central, da superexploração da força de trabalho e da destruição ambiental dos bens naturais comuns que insiste em se perpetuar nestas primeiras décadas do século XXI reafirmando seu caráter violento e espoliador. Neste chão, as relações econômico-políticas capitalistas se conformam de modo dependente e subordinado, o que reitera a insígnia de ‘quintal do mundo desenvolvido’. Daqui, por meio das ‘trocas desiguais’ e da ‘transferência de valor’, são fornecidas às economias imperialistas matérias-primas industriais e gêneros alimentícios e sob estes aspectos nos são retirados forçosamente os bens naturais comuns e a nossa existência-vida, por meio da super exploração da força de trabalho (Marini, 2005).

No contexto do saqueio mundial e da dependência latino-americana, o estado de Minas Gerais- Brasil ocupa um lugar emblemático na história. No passado, foi saqueado pelas metrópoles europeias, e no presente, pelas nações imperialistas. É neste território que se localiza o chamado quadrilátero ferrífero que é a mais importante província mineral do sudeste do Brasil. Localizado na região centro sul do estado de Minas Gerais é o marco principal da interiorização da ocupação portuguesa no século XVIII. Desde a descoberta do ouro no final do século XVII até os dias de hoje a região do Quadrilátero Ferrífero abriga a maior concentração urbana do estado de Minas Gerais. Nele foram fundadas as primeiras vilas afastadas do litoral, Ouro Preto, patrimônio cultural da humanidade pela Unesco, e Mariana, que possuem um rico acervo arquitetônico e cultural barroco, expressão máxima do ciclo do ouro no Brasil. Ouro Preto recebeu o título de patrimônio cultural da humanidade pela Unesco em 1980. Com cerca de 7000 km2 em área o Quadrilátero Ferrífero é o limite ocidental da Mata Atlântica no centro de Minas Gerais. O estado de Minas Gerais tem na mineração uma de suas principais atividades industriais. E o Quadrilátero Ferrífero é a região que mais se destaca em função das jazidas de ferro. Estimativas do início do século apontam que mais de 55 milhões de toneladas de minério de ferro eram anualmente explotadas. A região tem grande importância econômica e social no estado. Em sua parte norte, está localizada a capital o estado, Belo Horizonte com cerca de 2,4 milhões de habitantes. Os municípios da região têm uma população que corresponde a cerca de 22% da população do estado e a sua produção abrange 26,8% do PIB de Minas Gerais. (UFOP, 2022)

Esta região possui marcas sangrentas decorrentes da destruição da fauna, da flora e dos mananciais de água, dos acidentes de trabalho, das mortes desencadeadas por inúmeros rompimentos criminosos de barragens de rejeitos da mineração extrativista em atuação. Sua história recente é marcada a ‘sangue e lama’ pelos rompimentos criminosos de barragens. Em 2015, no município de Mariana-MG, O rompimento/crime da barragem de Fundão, de propriedade das mineradoras Samarco Mineração, Vale S.A. e BHP Billiton despejou 43,7 milhões de metros cúbicos de rejeitos na bacia hidrográfica do rio Doce, deixando um lastro de vinte mortes entre moradores do distrito de Bento Rodrigues, que foi imediatamente atingido, e trabalhadores que estavam no canteiro de obras da barragem. A lama também destruiu e matou a fauna e a flora ao longo dos mais de 600 quilômetros de rios até chegar e adentrar o oceano no estado do Espírito Santo. Foram atingidos 36 municípios mineiros e 03 capixabas. (Bertollo; Nogueira, 2020: 102).

Em 2019, no município de Brumadinho-MG, o rompimento/crime da barragem da Mina Córrego do Feijão de propriedade da Vale S.A despejou cerca de treze milhões de metros cúbicos de rejeitos, tendo sido considerado o maior acidente de trabalho com perdas de vidas humanas do país. Foram causadas, imediatamente, cerca de 300 mortes de trabalhadores da mineradora que naquele momento cumpriam expediente e, também, de moradores e moradoras locais. No que se refere aos danos ambientais, além de destruir fortemente o município de Brumadinho e o distrito de Córrego do Feijão, o rompimento/crime atingiu diretamente vários municípios ao longo da bacia do rio Paraopeba causando danos irreparáveis à fauna e flora. (Bertollo; Nogueira, 2020: 102-103)

Tais rompimentos criminosos explicitam o modos operandi do capital e de seus expoentes-das mineradoras, neste chão secularmente saqueado e explorado. O padrão de reprodução do capital nos marcos do capitalismo dependente produz e transfere valor às nações imperialistas e suas classes dominantes, deixa para este chão destruição ambiental e exploração da força de trabalho, o que conforma um cenário de violências, violações, opressões. (Bertollo, 2021: 467).

É a partir de tais determinantes que a luta de classes se acirra, e nesta, as lutas sociais, dialeticamente, se afloram com força e protagonismo das mulheres, tornando as resistências cada vez mais enraizadas e articuladas nas comunidades e entre os territórios atingidos pela mineração extrativista na região.

O cenário de exploração, violência e opressões:

retratos da sua incidência sobre as mulheres

O cotidiano das populações e comunidades que vivem no entorno dos complexos produtivos da mineração, próximo às barragens de rejeitos e aos complexos produtivos/minas é de destruição ambiental, violência e opressões. Esse cenário de ‘morte em vida’ recai mais fortemente sobre as mulheres, uma vez que a sociabilidade burguesa tem a opressão de sexo e gênero como alguns dos seus pilares de sustentação. E neste território conformado secularmente pela escravização do povo negro, é imprescindível reconhecer que o racismo também se perpetua como um elemento estruturante das opressões e violências sobre as mulheres em luta contra a mineração extrativista.
Reconhecendo tais premissas violentas e opressoras, nas linhas que seguem evidenciaremos alguns âmbitos desse contexto que se põe sobre as mulheres, bem como sua força, resistência e protagonismo nas lutas travadas historicamente.

Sobre as perdas e o luto os acidentes de trabalho e as mortes na mineração são uma constante

Considerada como a atividade econômica que mais mata trabalhadores no Brasil, somente em 2016, quando a taxa nacional de óbitos no trabalho foi de 5,57 para cada grupo de 100 mil empregados formais, a mineração registrou uma taxa de 14,81 mortes, ou seja, as atividades do setor mineral matavam três vezes mais que a média dos outros setores. De acordo com os dados do Observatório de Saúde e Segurança do Trabalho do Ministério Público do Trabalho (OBSERVATÓRIO SST, 2020), nas mineradoras, no Brasil, foram 25.650 notificações de acidentes de trabalho, entre 2012 e 2018, sendo que uma parcela dessas vítimas teve que se aposentar por invalidez ou morreu. (Coelho et al., 2020: 125)

Minas Gerais possui estimativas elevadas de acidentes e mortes no processo produtivo da mineração extrativista. Oliveira (2015) afirma que entre 1986 e 2014 ocorreram 06 rompimentos que desencadearam mortes de trabalhadores da mineração no estado. A maioria destes rompimentos ocorreu na região do quadrilátero ferrífero, que em 2015 e 2019 fica marcada pelos já mencionados rompimentos da Barragem de Fundão em Mariana-MG, e da Barragem B1 em Brumadinho-MG, que ganharam repercussão mundial.
Acerca das mulheres que lutam para recomeçar suas vidas depois de terem sofrido perdas e vivenciarem a dor do luto em decorrência da morte de familiares em rompimentos de barragens da mineração em Minas Gerais, Monteiro (2020), afirma que

Todas elas são unidas pelo fato de serem mulheres. E a gente ainda tem uma cultura muito machista. Algumas não trabalhavam até então e seguiam a rotina do homem provedor. Mas, no fim, são as mulheres que ficam, são elas quem aguentam o baque. Elas precisam ser muito fortes, têm filhos pra criar, uma vida para continuar e precisam superar o trauma. O que une essas mulheres também é a força de seguir em frente.

Uma mãe que perdeu o seu filho no rompimento/crime da Barragem B1, de propriedade da mineradora Vale S.A., em Brumadinho, diz: “Vale assassina. Meu fio não sai do meu pensamento. Fico olhando pro portão e esperando. Onde já se viu mãe enterrar fio?” (Vespa, 2019). Além do luto pelos filhos já adultos, é relevante mencionar que os rompimentos criminosos ocorridos em Mariana-MG e em Brumadinho-MG causaram, respectivamente, um aborto involuntário em uma moradora do distrito de Bento Rodrigues, e a morte de uma trabalhadora grávida de uma menina. A moradora atingida, mulher gestante que sofreu o aborto relata o contexto de pânico, dor e sofrimento em meio à lama de rejeitos de minério de ferro

Eu pedi a Deus que se fosse da vontade Dele, deixasse meu filho sobreviver, mas se fosse para ele morrer, eu entenderia. Foi quando senti meu filho sair da minha barriga, caindo pelas minhas pernas. Pode ter sido melhor assim, pois engoli tanta lama que ele poderia nascer sem saúde. Pensei que também iria morrer. Até hoje sinto dores no corpo. Perdi meu filho de 3 meses e minha sobrinha, que 40 minutos antes foi em casa e ao sair me pediu benção. Vou lutar por meus direitos até o fim. Dinheiro nenhum vai trazê-los de volta. Mas não vou desistir. (Madruga, 2015).

Esse contexto de perdas e luto pelos familiares assassinados no processo produtivo da mineração extrativista é sentido pelas mães e pais, irmãos e irmãs, filhos e filhas, amigos e amigas dos homens e mulheres que saíram de casa em busca do sustento da família e jamais retornaram. Também, é muito fortemente sentido pelas mulheres companheiras desses trabalhadores, uma vez que se soma à dor e sofrimento pelas mortes, outras questões dolorosas e opressivas, tais como o machismo.

Sobre o machismo, assédios e calúnias

O capitalismo pressupõe as opressões de sexo e gênero. As tentativas incessantes de calar e ocultar as mulheres, seus anseios, pautas e lutas são uma constante tanto na esfera da produção como na esfera da reprodução social. Em uma análise crítica a tal contexto e premissas, Toledo (2017: 30) afirma:

Cultua-se a ideia de que a mulher é um ser inferior porque é mais frágil fisicamente que o homem e tem o cérebro menor e o coração maior. Portanto, seria menos inteligente, menos racional e mais emotiva e sentimental. Logo, só serve para ter filhos e cuidar da casa e da família.

O contexto da mineração extrativista na região do quadrilátero ferrífero carrega e reproduz tais âmbitos estruturantes das relações sociais sob a égide do capital. Uma mulher, viúva de seu companheiro morto no rompimento ocorrido em Brumadinho-MG relata:

E pras viúvas que ficaram tem que ter muita força, sabe, porque o preconceito é muito grande. As pessoas fazem muita piadinha. Ninguém respeita o sentimento dos outros, né. Se vê você ali conversando com a pessoa, já fala: olha lá já tá arrumando um, né. E pra pessoa, pra mulher escutar isso é muito doloroso, é muito doloroso, porque o homem não tem isso, né. O homem, se acontece alguma coisa, a esposa morre ou se ele separa, tudo é normal, e pra mulher não é normal, né. Então assim, as pessoas elas olham pra gente como: há… tá com a vida feita, né! Ha… o homem deixou a mulher, agora o outro vai pegar. Agora quem pegar, é um bom partido, né. Eu já escutei isso. Agora as pessoas falando: agora você é um partidão! As pessoas não respeitam o sentimento da gente, não. E se vê a gente rindo um pouquinho já fala: olha lá, nem lembra mais do marido, né. Só que a história, ela é outra. (Monteiro, 2020b).

Acerca do rompimento/crime da barragem de Fundão em Mariana-MG, são inúmeras as expressões do machismo e da opressão que se impõem sobre as mulheres atingidas ao longo dos 600 km de destruição causada pela lama de rejeitos. O não reconhecimento enquanto provedoras da renda familiar, pela Fundação Renova é uma dessas expressões, sendo fortemente denunciado pelas próprias mulheres atingidas e por movimentos sociais que atuam na causa.

As mulheres atingidas não estão sendo reconhecidas para efeitos de políticas de indenização da Fundação Renova. Essa violação começa no processo de cadastramento: em geral não são realizados atendimentos individuais dos membros da família, dada a situação de desigualdade de gênero imposta pela presença do patriarcado na sociedade, e em muitos casos o preenchimento das informações foram realizados pelos homens. O universo de cadastrados é em média 50% homens e 50% mulheres. Sendo que apenas 30% das mulheres recebem algum tipo de benefício, em geral na condição de dependente do marido, apesar da Deliberação nº 119 do Comitê Inter Federativo (CIF) estabelecer que no processo de indenização não deve haver discriminação de origem, raça, sexo, cor, idade e qualquer outra forma, trabalhos de mulheres associados à cadeia de pesca, como a limpeza dos peixes, a preparação das redes e a pesca para alimentação, são vistos como auxiliares, não passando a integrar os auxílios e indenizações. Além desses, atividades como comerciantes/barraqueiras; vendedoras de produtos, salgados, água, chup-chup para turistas no rio; e salão de beleza, não são reconhecidos como afetados pelo empreendimento (MAB, 2020).

Outra forma de violência sobre as mulheres que decorre do rompimento/crime e do processo de reconstrução e restauração dos danos materiais, é o assédio sexual realizado por homens trabalhadores das empresas terceirizadas que passaram a conformar a dinâmica laboral e cotidiana dos locais destruídos, conforme é explicitado em reportagem especial publicada no jornal ‘A Sirene’, meio de comunicação e denúncia elaborado pelos próprios atingidos e atingidas.

Além do desafio de não serem reconhecidas como trabalhadoras pelas empresas causadoras dos danos (Samarco, Vale e BHP Billiton) ao serem consideradas como dependentes dos maridos no processo de cadastramento, as mulheres também sofrem com o assédio dos trabalhadores das terceirizadas contratadas para atuar nas comunidades. A chegada de tantos homens nas cidades de Barra Longa e Rio Doce alterou o cotidiano dessas mulheres e trouxe novos problemas para regiões que já sofreram tanto com o crime das mineradoras. (A Sirene, 2019: 7)

A defesa dos territórios, das comunidades e redes de vizinhança também coloca as mulheres como alvo de perseguição, assédio e calúnias, por vezes, de próprias lideranças locais que se alinham às mineradoras e atuam de forma a apaziguar – da pior e mais traiçoeira maneira possível – as lutas cotidianas travadas pelas lideranças mulheres que pautam os interesses legítimos dos territórios, comunidades e população, tal qual é explicitado e denunciado em notas de repúdio emitidas pela Frente Mineira de Luta das Atingidas e Atingidos pela Mineração em Minas Gerais (FLAMa).

Ameaças, agressões e assassinatos são cada vez mais frequentes em territórios que se encontram sob tensão e conflitos sociais. Nesses territórios, são comuns os casos em que homens ligados às empresas, seja por interesses políticos, seja por interesses econômicos, atuam de maneira brutal no silenciamento das mulheres lutadoras sociais. Por meio das redes sociais e de mensagens privadas repletas de ironia, sarcasmo, de ambiguidades que deixam um cheiro de ameaça no ar, esses homens, orientados pelo machismo e preconceito e, pela conivência das autoridades, se sentem totalmente à vontade para se manifestarem de forma ameaçadora e silenciadora sobre não somente as mulheres lutadoras sociais, mas também, contra qualquer mulher que ouse se manifestar contra os interesses da ordem capitalista vigente. Em Antônio Pereira, distrito duramente assolado pelos conflitos decorrentes da atividade minerária da Mina de Timbopeba, de propriedade da Vale, e de sua barragem mais próxima do meio urbano, a barragem do Doutor, não é diferente. Da mesma forma que ocorre no mundo todo, vemos nesse distrito o seguinte cenário: homens que se sentem à vontade para ridicularizar, silenciar, ofender e ameaçar mulheres que se colocam a favor e lutam pelos legítimos interesses da comunidade, da população local e contra os interesses da mineradora, que é de continuar destruindo o território e lucrando com isso. (FLAMA, 2021).

Sobre a repressão policial.

O contexto repressivo, em que se utilizam aparatos policiais para coagir e apaziguar as resistências protagonizadas pelas mulheres lutadoras sociais, é explicitado e denunciado em nota emitida pela FLAMa.

Essas repressões e criminalizações incidem fortemente sobre as mulheres lutadoras sociais. São mães, esposas, irmãs, filhas que se põem na luta e resistência, mas que são expostas e submetidas a situações de machismo, sexismo e racismo por parte das mineradoras e suas equipes de trabalho que atuam nos processos de reparação, e também por parte do poder policial que intervém nas atividades de denúncia e resistência protagonizadas pelas comunidades e por estas mulheres. (FLAMA, 2021a).

Uma das estratégias de luta assumidas historicamente pelas populações atingidas pelas mineração extrativista é o fechamento de estradas. No distrito ouropretano de Antônio Pereira ações de fechamento das estradas e paralização do trânsito, especialmente dos ônibus que levam os trabalhadores para as minas, têm sido utilizadas pela comunidade a fim de evidenciar o descaso do poder público e as violências que as mineradoras impõem à comunidade e ao território. Prioritariamente, tais ações ocorrem a partir do protagonismo das mulheres

Mulheres “Guerreiras de Antônio Pereira” fecham MG 129, nesta quarta-feira 1/12, mesmo debaixo de chuva, para reivindicar Assessoria Técnica aos atingidos pela Mineração em Antônio Pereira pararam o trevo de acesso a Bento Rodrigues. A comunidade reclama o sofrimento com os impactos do risco do rompimento da barragem Doutor. Os atingidos cobram por direitos, Assessoria Técnica Independente, novas remoções e investimento na saúde do distrito. As mulheres temiam represálias da Vale e da PM.n. (Diário de Ouro Preto, 2021).

Sobre esta mesma manifestação, Loureiro (2021) retrata o contexto de intervenção e repressão policial sobre as manifestantes:

A manifestação foi dispersada poucos minutos depois das 9h da manhã, tendo ocorrido a ação da Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG), com várias viaturas e policiais. A Agência Primaz apurou que essa ação não contou com a atuação de integrantes do sub-destacamento da PMMG localizado em Antônio Pereira, uma vez que o ato foi realizado fora de seus limites de jurisdição. Em vídeo divulgado nas redes sociais, a ação da PMMG foi parcialmente documentada, sendo possível ver policiais militares tentando impedir o deslocamento dos manifestantes pela rodovia, em direção ao distrito de Antônio Pereira. “Não vai ser permitido subir continuando ‘fechando’ a rodovia. Já extrapolaram o tempo, vocês não querem acordo, vocês não querem diálogo. Então o alerta já foi feito. A ordem é ‘pra’ liberar a via, ‘tá ok’? Quem recusar liberar a via vai ser conduzido em flagrante”, diz um policial, cuja identificação não é possível ser feita pelo vídeo. (Grifos originais).

É perceptível que a coerção é utilizada, mesmo que travestida sob o manto da ‘orientação’ às manifestantes. A partir de tal realidade, a FLAMa reitera

As mulheres não se calarão diante da repressão do poder público, especialmente o policial, que criminaliza quem luta e resiste ao invés de atuar sobre os verdadeiros responsáveis pelos crimes contra a vida, o meio ambiente e o bem comum das comunidades atingidas pela mineração. (FLAMA, 2021a).

Este contexto de repressão e ameaças articula-se com a burocracia e morosidade assumidas como forma de funcionamento de diferentes instâncias, inclusive daqueles que deveriam assumir a defesa dos direitos e demandas que a população apresenta.

Sobre a burocracia estatal, do judiciário, das mineradoras e da Fundação Renova
A burocracia Estatal, do judiciário, das mineradoras e da Fundação Renova no trato com as comunidades e populações atingidas é uma engrenagem funcional ao atual modelo de mineração no quadrilátero ferrífero de Minas Gerais. São notórios os desgastes, os constrangimentos, os cansaços e os adoecimentos decorrentes da morosidade destes trâmites burocráticos. Percebe-se que as lutas sociais, as denúncias e reivindicações comunitárias-populares tendem a ser desrespeitadas e sucumbidas diante dos interesses das mineradoras, que, no caso do rompimento/crime da barragem de Fundão, são materializados a partir da atuação da Fundação Renova, com respaldo legal-jurídico e normativo pelo Estado Brasileiro (Bertollo, 2018).

Passados 06 anos do rompimento/crime da barragem de Fundão, e 03 anos do rompimento/crime da barragem B1, temos um cenário de morosidade em ambos os casos. Na voz dos/as atingidos/as e dos movimentos sociais, estes são “crimes que se renovam” cotidianamente, e “por renovar-se a cada dia, novos dilemas, dificuldades e entraves se colocam a estes sujeitos vítimas do processo de extração de mais valor via processo produtivo pautado na mineração extrativista. (Bertollo, 2018: 249).

Com tantos recursos e poder, era de se esperar que as mineradoras buscassem agilidade e competência no processo de reparação, mas o que se vê são caras propagandas transmitindo inverdades no horário nobre da TV e a disponibilização dos recursos para a Fundação Renova, uma organização criada por essas empresas para “gerir” o processo de reparação e quase nenhuma efetividade nas respostas a quem de fato interessa: as pessoas atingidas. (Cáritas Brasileira, 2020)

Acerca do processo de reparação dos danos (e da burocracia e morosidade) decorrentes do rompimento/crime da barragem de Fundão e que perpassam a relação entre os/as atingidos/as, a Fundação Renova e as equipes de Assessoria Técnica Independente (ATI); as entidades Cáritas Brasileira, FLAMA e Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (AEDAS)- denunciam, a partir de uma ‘Nota pública em defesa das matrizes de danos construídas com a população atingida por uma indenização justa e integral’, que

A Fundação Renova é a responsável pela reparação dos danos, contudo, vem conduzindo as negociações para indenização com regras e critérios elencados de forma unilateral, propondo valores irrisórios e visando defender os interesses de suas mantenedoras, rés do desastre-crime: Samarco, Vale e BHP. O modelo indenizatório proposto pela Fundação Renova no município de Mariana, assim como o sistema indenizatório simplificado chamado “Novel” aplicado em Barra Longa e em município da Bacia do Rio Doce, reproduzem a violação aos direitos humanos e ao meio ambiente condizentes com o nível do constrangimento causado pelo desastre-crime. (Cáritas, 2021)

É superficial e sem efetividade o conjunto de ações operacionalizadas pela Fundação criada para fins de reparação e reconstrução das comunidades atingidas e destruídas. E nesse emaranhado de programas, reuniões, cadastros e procedimentos excludentes, as mulheres se configuram como duplamente violentadas e oprimidas, conforme é denunciado pelo Movimento de Atingidos por Barragens (MAB)

Sobre o cadastro, o AFE e o PIM, os programas da Fundação Renova que as mulheres reclamaram na ouvidoria, as principais questões colocadas por elas são de informações sobre a situação do cadastro, atrasos, demoras e erros no pagamento dos auxílios e das indenizações. Em um processo em que as mulheres não são reconhecidas e não recebem seus direitos de forma independente é de se esperar um aumento da vulnerabilidade, dificuldade de arcar com os custos do lar, sobrecarga doméstica e na saúde mental, assim como aumento dos conflitos familiares. (MAB, 2020)

Em relação ao rompimento/crime da Vale em Brumadinho, a situação também é de morosidade, burocracia, pactuações e negociações sem a presença, e que desconsideram as demandas dos/as atingidos/as.

Enquanto os problemas econômicos, sociais e ambientais se ampliam, a Vale busca ter o controle do processo de reparação dos danos causados por ela mesma, utilizando-se de todos mecanismos à disposição da segunda maior mineradora do mundo. Além de articular nos governos e no Poder Judiciário diversas formas de negar direitos, dificultando a participação dos atingidos no processo, a empresa trabalha cooptando lideranças locais para criar conflitos entre os moradores e enfraquecer a luta coletiva. Além disso, promove assédio moral através de seus funcionários. Paralelamente a essa atuação deplorável no território, em fevereiro de 2020, a empresa fez um acordo com o governo do estado e entidades de justiça, sob sigilo e sem o envolvimento das famílias atingidas, economizando R$ 17 bilhões. Dos R$ 54 bilhões pedidos nas ações de reparação dos danos, a Vale vai pagar apenas R$ 37 bilhões. Parte desse montante será transferido para o governo do estado investir em obras que nada têm a ver com a reparação do crime de Brumadinho. (MAB, 2022)

O contexto burocrático, moroso e desrespeitoso também é cotidianamente vivenciado pelas comunidades e populações que residem no entorno das barragens que estão em alto risco de rompimento. Essa é a situação a que o distrito de Antônio Pereira é submetido há anos em decorrência do complexo produtivo da Mina Timbopeba e da barragem do Doutor, localizada a poucos metros das residências, escolas, rios e áreas de preservação ambiental. No entanto, a Vale S.A. recusa o diálogo e dificulta/não presta atendimento efetivo à comunidade. A opção assumida pela mineradora é a burocracia amparada em trâmites estatais e jurídicos que portam consigo a morosidade dos processos e deliberações.

Em reunião online de negociação entre Vale, Ministério Público de Minas Gerais e os atingidos de Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto (MG), que aconteceu na terça-feira (11), os atingidos discutiram as principais pautas para a região e as ações da mineradora que impactam e amedrontam o dia a dia da comunidade. Apesar do diálogo, muitas dúvidas ainda permanecem no ar e a empresa não concordou em marcar uma nova data para continuar esclarecendo informações para a população afetada da região, na negociação, representantes da Vale não levaram nenhuma resposta sobre os 22 pontos de reivindicação apresentados pela comunidade e pelo Ministério Público, não trouxeram informações sobre a nova mancha de inundação, anunciaram que a empresa não pagará por uma assessoria técnica para os atingidos e não concordaram em marcar uma nova data de reunião, mostrando o desinteresse em seguir com as negociações coletivas e extrajudiciais. (MAB, 2020)

A comunidade há anos enfrenta, denuncia e expõe os desmandos da mineradora Vale S.A. em relação às pautas urgentes e aos direitos mais elementares da população ali residente. Em manifestação pacífica, em que foi realizado o fechamento de estrada por quase 05 horas, uma moradora atingida denuncia e reivindica:

Nós somos moradoras de Antônio Pereira, e estamos parando a MG-129 para reivindicar direitos nossos que a Vale está tirando. Nós estamos aqui no ponto onde o trânsito vai para Bento Rodrigues e para Antônio Pereira, para que a gente chame a atenção, e que a gente seja ouvido, por conta do desespero que nós estamos sofrendo no território. As pessoas estão em pânico, não tem saúde, não confiam mais nas informações da Vale, que tem dificuldade de comunicação com a comunidade. Então, nós estamos aqui reivindicando os direitos e pedindo, gritando socorro, pedindo apoio de toda a comunidade das cidades vizinhas e dos trabalhadores para abraçar nossa causa, porque a situação nossa ‘tá’ muito complicada e desesperadora. Estamos totalmente desolados e jogados às traças. (Loureiro, 2021)

Tal situação impõem às comunidades atingidas um contexto de adoecimento físico e mental, que fortemente atinge as mulheres por estarem na linha de frente das resistências.

Sobre o adoecimento físico e mental

A ofensiva sobre a condição de saúde física e mental das populações próximas aos complexos produtivos, barragens de rejeitos e atingidas diretamente pelos rompimentos criminosos é estruturante da mineração extrativista na América Latina. A contaminação da água, do ar e do solo provoca adoecimentos e mortes, e neste cenário, “os problemas de saúde gerados pelos crimes de mineração estão entre os principais problemas sofridos pelas mulheres atingidas” (MAB, 2019).
Em reunião com o Ministério Público Federal, ocorrida no mês de janeiro de 2022, membro da coordenação estadual do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), afirma

A gente debate a condição como um todo, a contaminação da água com metais pesados, a questão da saúde de toda a comunidade exposta a esses metais e também a questão das detonações que estão rachando as casas e isso tem que ser reparado. (Diário de Santa Bárbara, 2022: 4)

Nesse mesmo espaço de denúncia e questionamento aos órgãos legais e normativos da justiça brasileira, uma atingida – moradora da comunidade em que está instalada a barragem da mineradora AngloGold relata sobre o atual contexto de adoecimento que se abateu sobre a população do município de Santa Bárbara-MG.

A comunidade não confia no plano de contingência e gerenciamento de crise promovido pela empresa e a situação psicológica já não se encontra estável. Existem pessoas com dificuldades para cumprir suas obrigações pelo estado emocional comprometido, crianças com dificuldades e distúrbios de sono pelo grande impacto causado pela falta de responsabilidade social da empresa. Além de pessoas que tiveram gastos com atendimentos médicos e ambulatoriais. (Diário de Santa Bárbara, 2022: 4)

O agravamento da condição de saúde das mulheres atingidas pelo rompimento/crime da barragem de Fundão, tornou-se explícito. Estudo realizado expõe os seguintes dados:

Saúde, com destaque à saúde física em geral (12,14% de recorrência), acesso à saúde (11,82%) e a evolução ao longo dos anos dos relatos de saúde mental, que vão de 1,2% em 2016 para 12,8% em 2019. Ainda, os relatos que apontam para condições crônicas como câncer mostram-se críticos e extremamente sensíveis, assim como os que relatam tentativas de suicídio e depressão, (v) Sobrecarga doméstica, que se apresenta como o segundo principal tema identificado nos relatos (33,92%), sendo composto principalmente de demandas relativas às dificuldades de manter os custos do lar (23, 64% do total geral, e que, ao longo dos anos, aumenta de 5,2% em 2016 para 37,9% em 2019) e também cuidados com filhos e netos (16% dos relatos “Mulheres”); (vi) por fim, e não menos importante, aponta-se para relatos que contém descrições sobre conflitos familiares (44 relatos) e casos de violência doméstica. (7 relatos) (Fundação Getúlio Vargas, 2029: 10-11)

Nesse bojo de adoecimento físico e mental, uma situação que passou a ser rotineira na vida das mulheres atingidas pelos rompimentos criminosos de barragens é o adoecimento de seus familiares, especialmente seus filhos que carecem de maiores cuidados pela condição de serem crianças.
Uma moradora de Barra Longa-MG, município atingido pelo rompimento da barragem de Fundão, afirma sobre o adoecimento de sua filha, uma criança com poucos anos de vida, em decorrência da contaminação pelos rejeitos de minério de ferro e demais substâncias tóxicas presentes na lama que atingiu o centro do munícipio, e se não bastasse, foi utilizada para calçar a rua que dá acesso à sua moradia levando as substâncias tóxicas até a porta de sua casa. Diz ela: “recebeu um diagnóstico gravíssimo. Está com inflamação do cérebro e no intestino e isso pode mudar o rumo da vida dela” (Maciel; Pina, 2019).

Sobre as consequências do rompimento/crime da barragem B1 da Vale em Brumadinho-MG, que atingiu a Bacia do Rio Paraopeba e deixou um lastro de contaminação e adoecimentos, uma moradora de São Joaquim de Bicas-MG relata acerca da qualidade da água que chega nas torneiras de sua residência e é utilizada para o consumo humano:

Como coloco uma água dessa para meu filho comer e beber? […] Antes da barragem estourar a gente não via a água assim. Porque eles estão tratando com mais produto? É porque tem alguma coisa na água. […] A gente vem sofrendo com a poeira. Posso limpar a casa agora e 30 minutos depois ela já estará suja novamente. A Vale poderia colocar capota nos caminhões e não coloca. Isso está nos prejudicando muito; […] De um ano para cá, a asma piorou muito. (MAB, 2021)

Outra mulher atingida relata: “[…] aqui virou um mausoléu, as pessoas ficam tristes pelos cantos. A minha vida virou hospital. A minha sogra ficou tão estressada e triste que teve vários AVCs [Acidentes Vasculares Cerebrais] e faleceu” (Lopes, 2020).

Tais relatos apontam que a condição de saúde física e mental envolvem subjetividades destruídas e preocupações com questões materiais diretamente vinculadas à sobrevivência e bem-estar familiar, e nestas, os relacionamentos estabelecidos com demais membros da família, seja com os seus pais, filhos e netos, e/ou com seus companheiros.

Percebe-se que apesar da condição de atingida diretamente pelo rompimento/crime, são as mulheres as mais responsabilizadas pelo cuidado aos seus, o que firma um panorama de violência e negação de direitos que envolve diferentes instituições e interesses, muitas vezes, contrários ao que é legítimo e reivindicado pelas comunidades, configurando um cenário que somente perpetua o adoecimento.
Esse mesmo contexto, é impulsionado por outra forma de opressão e violência – o racismo, que se perpetua nessa sociabilidade de classes sociais antagônicas. Assim, a questão étnico-racial é mais um elemento conformador da exploração e opressões cotidianas.

Sobre o racismo

O processo de colonização dizimou as populações originárias da América Latina. O Brasil, o estado de Minas Gerais e as cidades que compõem o que atualmente chamamos de quadrilátero ferrífero, especialmente Mariana-MG e Ouro Preto-MG, são locais marcados pela diáspora e escravização do povo negro, trazido forçadamente para trabalhar nas minas de ouro e diamantes.
Dados do Censo 2010 realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), explicitam que a “população negra superou a branca em Minas Gerais. […] 45,4% dos mineiros se autodeclararam brancos contra 53,5% que se denominaram negros. […] 9,2% da população é preta e 44,3% parda” (MELLO, 2011). Dados mais recentes explicitam que “Em Minas Gerais, em 2012, a população negra representava 55,4% do total da população do estado. Em 2019, essa proporção aumentou, passou para 61,0%” (Fundação João Pinheiro, 2020).

Essa realidade étnico-racial explicita-se fortemente nos territórios diretamente atingidos pelo rompimento/crime da barragem de Fundão. Conforme Wanderley (2015), na época do rompimento e tomando por base dados do IBGE, a proporção de pretos e pardos no povoado de Bento Rodrigues era de 84,3%. No povoado de Paracatu de Baixo, também pertencente ao município de Mariana-MG, a proporção era de 80%. Já o percentual total da população preta e parda no município era de 67,3%.
Em relação à Barra Longa, município que também foi atingido e destruído pelo rompimento/crime da barragem de Fundão, o autor explicita que a proporção de população preta e parda, na época do rompimento/crime, era de 67%, sendo que no povoado de Gesteira, que foi completamente destruído pela lama, a proporção era de 70,4% (Wanderley, 2015).

Em Ouro Preto-MG, município vizinho de Mariana-MG, conforme dados do Censo 2010- IBGE, “70% da população se autodeclara negra” além disso, é marcado por “toda uma história de escravidão” (Coelho, 2017).

A partir de tais estimativas censitárias, é possível perceber a expressiva presença de descendentes dos negros e negras escravizados. São estes homens e mulheres, que na atualidade, conformam majoritariamente a população e consequentemente, a classe trabalhadora na região. Considerando que o capitalismo se estrutura a partir do antagonismo entre as classes sociais fundamentais, neste território, o racismo constitui-se em uma engrenagem da perpetuação da exploração capitalista e este determinante é cotidianamente enfrentado e denunciado pelas populações e comunidades atingidas.
Em Audiência Pública ocorrida no mês de novembro de 2019, no município de Barra Longa-MG, as/os atingidas/os denunciaram a perseguição política às/aos militantes, o racismo institucional e a discriminação sofrida por parte da Fundação Renova.

Nunca foi fácil ser negro no Brasil, mas, antes do crime da Vale, Samarco e BHP Billiton, eu não precisava me preocupar com o racismo. Eu não sentia essas coisas na pele, porque eu vivia no meu mundo, quietinha no meu cantinho, lá no meu alto de morro. Após o crime, eu precisei ocupar espaços que, até então, não eram meus. Desde então, eu tenho sentido, na pele, no corpo e na alma, a chicotada da elite. A cada passo que eu dou, eu vejo o preconceito e o racismo. A Fundação Renova nos persegue por sermos negros (as), sermos do alto do morro e militantes. Isso não tem sido fácil. (A Sirene, 2020: 8)

Tal realidade é forte e dolorosamente explicitada por uma mulher lutadora social, quando nos diz acerca da discriminação e das tentativas de cooptação que vivencia:

Por ser negra, mulher do alto do morro, já é uma invisibilidade, estou na luta já tem cinco anos. Imagina uma mulher preta do alto do morro militante? A empresa me fez uma proposta de sair da militância, de sair da frente das reuniões, se eu deixar de lutar pelo povo serei reconhecida como atingida e terei todos os direitos reconhecidos, inclusive o cartão emergencial retroativo. É dessa forma que as empresas atuam no território, se você é militante, se você tem coragem… a empresa é racista e machista, se você consegue ter espaço de fala você é ameaçada, tentam nos silenciar o tempo todo. Um funcionário da empresa em uma reunião de negociação, me mandou calar a boca. São essas coisas que uma atingida passa quando ela assume a posição de linha de frente. (Atingida de Barra Longa) (Jorge et al. 2020: 149)

As mulheres nas lutas:

as sementes foram plantadas e germinam

Acerca do modo de produção capitalista e da condição da mulher neste sistema econômico, político, histórico e cultural, Toledo (2017: 180) afirma que

[…] as mulheres não devem sentir a opressão e submissão como uma exceção à regra. Pelo contrário, devem senti-la como a confirmação da regra, como a confirmação de que vivemos num sistema injusto e desigual, em que o que prima é a opressão e a desigualdade.

Reconhecemos que, apesar das particularidades territoriais e culturais, a exploração, as opressões e violências advindas do contexto da mineração extrativista na região do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais- Brasil e que recaem sobre as mulheres lutadoras sociais são semelhantes às vivenciadas pelas luchadoras e defensoras ambientales do Equador, do México, da Nicarágua, da Colômbia, do Peru, da Argentina e demais territórios do nosso continente que sucumbem à logica extrativista ao longo dos séculos.

A partir de tais premissas, dos relatos e descrições das violências e violações, dos sofrimentos e lutos, do machismo e do racismo que recaem sobre as mulheres, conforme procuramos evidenciar nas linhas anteriores, enfatizamos que no contexto da mineração extrativista na região do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais – Brasil é factível que, dialeticamente, as mulheres “[…] são a linha de frente de todas as lutas, as coordenadoras de Grupo de Base, as mais presentes nas Comissões Locais e em todas as negociações” (MAB, 2020).

Hoje a mulher tomou a posição de defender os direitos tanto quanto atingida como mãe de família. A gente melhora quando acredita que as coisas podem ser mudadas. Leva tempo, dá trabalho, mas a gente tem que fazer o que é correto e justo. (MAB, 2021).

A partir de toda modificação imposta às suas vidas, em que se tornaram de uma hora para outra atingidas diretas do maior crime socioambiental do país, as mulheres inseriram-se cada vez mais na dinâmica das lutas sociais na região, nos espaços institucionais e políticos de enfrentamento à mineração extrativista, às mineradoras causadoras do rompimento/crime e à própria Fundação criada para fins de reparação, considerando sua questionável atuação.

E nos territórios que estão sob a iminência de novos rompimentos criminosos de barragens de rejeitos, as mulheres inspiram-se nessas posições e potencializam e articulam suas lutas a fim de denunciar a condição a que suas comunidades estão submetidas, bem como reivindicar procedimentos técnicos por parte das mineradoras para a não repetição de crimes da mineração nessa região dolorosamente marcada a “sangue e lama”.

Esta região que historicamente é reconhecida pelas lutas travadas desde o período colonial especialmente em relação à escravização do povo negro e à condição a que eram submetidos nos trabalhos nas minas, no tempo presente, reivindica esse passado de resistência e inscreve as pautas e demandas a partir das determinações econômicas, políticas, culturais e sociais que o capitalismo institui e perpetua neste chão a partir de um modelo de mineração submetido à lógica da mundialização do capital, dependência, destruição ambiental e superexploração da força de trabalho.

Assim, é fundamental reconhecer que a mineração extrativista fortemente ampliada e impulsionada nas últimas décadas em nosso continente, intenta, além da obtenção da mais valia e do lucro dos acionistas das mineradoras pela exploração e destruição física da força de trabalho, a dominação subjetiva, cultural, política, de gênero e racial nos territórios e comunidades, e nesse sentido, são as mulheres as prioritariamente atacadas devido à posição de protagonismo nas lutas e denúncias que realizam.

Gualba (2019: 24–25) afirma que:

El modelo extractivista concibe a la tierra y a los cuerpos de las mujeres como territorios sacrificables, agudiza y replica la violencia y la crueldad sobre estos cuerpos cuyo resultado extremo se convierte en muerte. […] Pese a ello, las mujeres han logrado ocupar espacios de poder, han comenzado a desempeñar funciones claves y estratégicas en los momentos de conflicto. Esto nos permite hablar de una feminización de las luchas contra el extractivismo […].

Em reportagem especial sobre o ‘8 M’ publicada no jornal A Sirene (2019) de partida é afirmado que “Ser mulher é uma luta”. As mulheres atingidas pelo rompimento/crime da barragem de Fundão afirmam:

“Nós não temos a opção de não estar na luta. É isso ou é isso. Eu faço o máximo para que a minha fala seja para todos, porque a nossa luta, como atingidas, é por todos”.

“Se a gente desistir dessa luta, tudo para. Mas, se a gente continua, a gente vai crescendo, vai conseguindo nosso objetivo, ajudando o outro, a família, a comunidade”.

“A gente vai para a luta procurar o direito da gente. Eu não tenho medo não, eu vou. Em todos os lugares que precisa ir, nós vamos”.

“Nós estamos sempre unidas. Toda reunião, ninguém falta. Não pode faltar, porque é lá que nós brigamos e conquistamos nossos direitos”.

“Eu vejo que as mulheres são muito participativas, mesmo com todas as outras jornadas que elas têm: família, filhos, marido, algumas trabalham fora”.

“Fico orgulhosa de ver as mulheres à frente. Eu falo “vamos lá, vamos caminhar juntas”. Não podemos permitir que as pessoas diminuam a gente e que a gente se sinta diminuída”.

“O que me faz estar na luta, muitas vezes, é o ‘não’ que a gente recebe. Nós temos mais força para conseguir um ‘sim’ sendo um grupo maior. O objetivo da minha luta é este: enxergar a necessidade do outro. Com a minha necessidade, eu enxergo a necessidade do outro. Eu luto pela comunidade […]”.

“A minha motivação é que sou ativista, eu luto por direitos. Não tem forma melhor de lutar do que em grupo. Lutando sozinha fica mais difícil alcançar o seu objetivo. Agora, nós somos um grupo grande […]”.

“Nós quebramos o preconceito que existe na sociedade machista de não dar crédito ao que as mulheres falam, de colocar as mulheres lá embaixo”.

A partir de tais relatos, que demonstram a aspereza de ser mulher lutadora social no enfrentamento à mineração extrativista na região do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais- Brasil, também é possível perceber a potência, a coletividade e o intento de superar a exploração, opressões, destruição ambiental e mortes que a mineração extrativista desencadeia. As mulheres deste território estão em marcha e não se calarão frente aos ditames do capitalismo, do patriarcado e do atual modelo de mineração em voga.

Considerações finais

Do passado colonial, da escravização do povo negro, da extração de ouro, ao presente sob os marcos do capitalismo monopolista, do trabalho assalariado e da extração de minério de ferro, a região do quadrilátero ferrífero de Minas Gerais–Brasil ocupa lugar emblemático na história mundial.

O atual modelo de mineração é uma das engrenagens da perpetuação da dependência em relação aos países imperialistas. A destruição ambiental e a expropriação são estruturantes da mineração extrativista. Os rompimentos criminosos de barragens de rejeitos são máximas expressões da superexploração da força de trabalho, e tudo isso conforma de modo muito agravado e violento o contexto da luta de classes neste território (Bertollo, 2017).

Diante de tal contexto, as mulheres têm assumido protagonismo nas lutas sociais travadas. Como resposta às manifestações de resistência frente às violências e opressões desencadeadas pela mineração extrativista, sofrem ataques, ameaças, cerceamentos, manifestações racistas, machistas, misóginas, repressão policial, calúnias, assédios, burocracias e morosidade nas respostas às demandas e pautas legítimas que apresentam. Tais tentativas de silenciamento partem de aparatos estatais-jurídicos e das mineradoras, que possuem um expressivo arsenal técnico, financeiro e burocrático direcionado ao apaziguamento dos conflitos sociais e ambientais nos territórios em que atuam.

Diante dessa realidade, apontamos a importância e necessidade de assumir cada vez mais fortemente o referencial teórico e político organizativo a partir da teoria social crítica a fim de compreender, para além da aparência, o capital enquanto uma relação social. Compreender o modo de produção capitalista e a extração de mais valor a partir da propriedade privada dos meios de produção e da exploração da força de trabalho via trabalho assalariado e, nesse sentido, compreender a particularidade que este modo de produção assume na América Latina, no Brasil e em Minas Gerais, território secularmente marcado como colônia da Europa, e que após a sua independência formal insere-se de forma subordinada na divisão internacional do trabalho, o que reafirma e conforma sob os fundamentos capitalistas a dependência e subordinação externa.

Assim, torna-se imprescindível compreender as classes sociais –suas conformações, expoentes e interesses, e neste bojo, o Estado– e seu caráter classista enquanto “comitê executivo da burguesia”. Ainda, compreender e reconhecer as distintas formas de opressão que este modo de produção requer para sua perpetuação, especialmente as opressões étnico-raciais e de gênero. Somente assim é possível avançar no entendimento e tomada de consciência em relação à exploração, opressões e violências próprias e estruturantes do capitalismo dependente.
A partir de tais premissas, é possível impulsionar e potencializar as lutas sociais e os enfrentamentos necessários e urgentes de serem protagonizados pela classe trabalhadora.

Potencializar o trabalho de base, as ações construídas desde e pelas populações e comunidades atingidas é tarefa primeira. Essa não é uma tarefa individual ou espontaneísta. Deve ser coletiva e possuir a perspectiva internacionalista. Nesse sentido, entidades sindicais, partidos políticos do campo da esquerda, organizações comunitárias, comitês populares, movimentos sociais, frentes amplas, comunidades diretamente atingidas e demais expoentes da classe trabalhadora portam em suas mãos a possibilidade histórica de revolucionar esta sociabilidade da barbárie e construir um novo tempo histórico com justiça, igualdade e liberdade à humanidade. É certo que nessa tarefa histórica cada vez mais urgente de se tornar realidade, as mulheres já possuem protagonismo.

Movimento pela Soberania Popular na Mineração

O post 25 de Novembro – Dia Internacional da não-violência contra as mulheres – Mulheres e Mineração: cenário de exploração, violência e opressões apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/11/25/25-de-novembro-dia-internacional-da-nao-violencia-contra-as-mulheres-mulheres-e-mineracao-cenario-de-exploracao-violencia-e-opressoes/feed/ 0
Sustentável para quem? O Lítio Brasileiro: A Promessa da Transição Energética e a Insustentabilidade Socioambiental https://www.mamnacional.org.br/2023/11/24/sustentavel-para-quem-o-litio-brasileiro-a-promessa-da-transicao-energetica-e-a-insustentabilidade-socioambiental/ https://www.mamnacional.org.br/2023/11/24/sustentavel-para-quem-o-litio-brasileiro-a-promessa-da-transicao-energetica-e-a-insustentabilidade-socioambiental/#respond Fri, 24 Nov 2023 17:18:39 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3808 No Vale do Jequitinhonha (MG) há um total de 558 processos minerários ativos de lítio o que representa 18% do território da região. Por Ananda Ridart e Ela lima    A mineração de lítio está dentro de uma complexa discussão sobre transição energética no combate às mudanças climáticas. O minério, muitas vezes chamado de “ouro […]

O post Sustentável para quem? O Lítio Brasileiro: A Promessa da Transição Energética e a Insustentabilidade Socioambiental apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
No Vale do Jequitinhonha (MG) há um total de 558 processos minerários ativos de lítio o que representa 18% do território da região.

Por Ananda Ridart e Ela lima 

 

A mineração de lítio está dentro de uma complexa discussão sobre transição energética no combate às mudanças climáticas. O minério, muitas vezes chamado de “ouro branco” da transição energética, é um recurso fundamental na produção de baterias usadas em uma ampla gama de dispositivos, desde telefones celulares até veículos elétricos. O Brasil está emergindo como um ator de destaque no cenário global da mineração de lítio, nos últimos anos, o país tem testemunhado um rápido crescimento na produção e na exploração de lítio, ao mesmo tempo que causa impactos socioambientais na população.

No dia 6 de julho foi publicado no Diário Oficial da União (DOU), o decreto nº 11.120/2022, que permite as operações de comércio exterior de minerais e minérios de lítio e de seus derivados. A medida promove a abertura e dinamização do mercado brasileiro de lítio, com o objetivo de posicionar o Brasil de forma competitiva na cadeia global, de acordo com o Ministério de Minas e Energia.

Construção da planta de produção e beneficiamento de concentrado de lítio da Sigma Mineração – Foto: Divulgação / Sigma.

Minas Gerais: Um Gigante do Lítio

O lítio está concentrado principalmente na região do Vale do Jequitinhonha, no estado de Minas Gerais. Entre 2021 e 2023, o Vale do Jequitinhonha experimentou um notável crescimento na produção de lítio, saltando do 11º lugar para o terceiro em termos de faturamento no país, ficando atrás apenas do ferro e do ouro, a produção de lítio no estado cresceu exponencialmente, alcançando um faturamento de R$ 1,44 bilhão entre janeiro e julho de 2023.

Segundo análises realizadas pelo Projeto de Pesquisa “Processos Minerários, Situação Agrária e Conflitos no Jequitinhonha” da UFVJM, Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, na mesorregião geográfica do Jequitinhonha há um total de 558 processos minerários ativos de lítio. Destes, a maior parte encontra-se nas fases de requerimento de pesquisa, autorização de pesquisa e requerimento de lavra. Estes processos ocupam uma área total de 658.471,33 há, o que representa 18% do território do Vale do Jequitinhonha.

A extração de lítio requer grandes quantidades de água, e o Vale do Jequitinhonha é conhecido por enfrentar problemas de escassez de recursos hídricos. A gestão responsável da água se torna fundamental para garantir que a exploração de lítio não exacerbe a situação da água na região. Cada tonelada de lítio requer cerca de dois milhões de litros de água, o que sobrecarrega ecossistemas locais já fragilizados e desafia a disponibilidade de água para as comunidades da região.

Bruno Milanez, professor no programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Juiz de Fora, onde atua na área de Política Ambiental, com ênfase em avaliação dos impactos da cadeia minero-metalúrgica, conflitos socioambientais e capacidade ambiental, explica que a empresa Sigma Lithium, atuante no Vale de Jequitinhonha, busca se posicionar como uma mineradora verde, no entanto, especialistas levantam a questão de até que ponto as operações de mineração podem ser verdadeiramente sustentáveis, considerando os altos impactos ambientais, o consumo de água e a geração de resíduos tóxicos associados a essa atividade.

Atualmente, a principal técnica de extração de carbonato e do cloreto de lítio é a evaporação de salinas. O processo começa por perfurar através da crosta e depois bombear a salmoura até à superfície para piscinas de evaporação, onde ela é deixada durante meses. Isso cria uma lama salgada composta por uma mistura de manganês, potássio, bórax e sais de lítio, que são depois deslocados para outra piscina de evaporação ao ar livre. Ou seja, a extração de lítio cria gigantescas piscinas radioativas, cujos riscos ainda não podem ser contabilizados, apesar de previsíveis: contaminação do ar, das águas superficiais e subterrâneas, e consequentemente de todo o entorno.

Além dos impactos ambientais, a mineração de lítio também levanta questões sociais. A exploração de lítio muitas vezes ocorre em terras ocupadas por comunidades locais, incluindo comunidades indígenas. A falta de consulta prévia a essas comunidades, conforme estipulado pela Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, é uma violação de direitos fundamentais.

Mapa de modelos minerários no Vale do Jequitinhonha de 1973 a 2020

Mapa de modelos minerários no Vale do Jequitinhonha de 2021 a 2023

“A venda da ideia do lítio como estratégico dificulta o movimento de resistência, porque pode parecer que as pessoas vão ter que sacrificar para salvar o mundo, quando na verdade não vai salvar o mundo” explica Milanez.

As atividades de mineração podem resultar na deslocação de comunidades, destruição de terras agrícolas e impactos na cultura local. As promessas de desenvolvimento econômico nem sempre se traduzem em benefícios tangíveis para as populações locais.

Para o professor Cláudio Scliar, especialista em Geociências e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a régua para medir a sustentabilidade da mineração deve ser outra.

“A régua que se deve ter para medir a sustentabilidade na mineração é a parte de qualidade de vida dos trabalhadores da comunidade nos territórios e a contribuição para um desenvolvimento justo sustentável para a soberania do país” aponta Scliar.

Em busca do “ouro branco” do Novo Mundo

A América Latina concentra no “triângulo do lítio” cerca de 60% das reservas mundiais desse mineral, considerado essencial para a produção de baterias que prometem substituir o uso dos combustíveis fósseis, cuja queima é responsável por boa parte da emissão de carbono na atmosfera. No entanto, pouco se fala dos impactos que serão causados pela indústria do lítio.

O golpe de Estado que derrubou Evo Morales da presidência da Bolívia, em 2019, teve como um dos principais motivos a disputa pelo lítio, um mineral estratégico para a transição energética. A Bolívia é o país com as maiores reservas de lítio do mundo, estimadas em 21 milhões de toneladas, o que representa 50% das reservas mundiais. O lítio é um componente essencial para a produção de baterias de lítio, que são utilizadas em veículos elétricos, smartphones, notebooks e outros dispositivos eletrônicos.

O governo de Morales, de orientação progressista, defendia uma política de exploração do lítio sob controle estatal, com o objetivo de gerar benefícios para o povo boliviano. Essa postura contrariava os interesses das empresas multinacionais, que desejavam explorar o lítio boliviano sob seus próprios termos.

No contexto da transição energética, o lítio tornou-se um recurso cada vez mais valioso. Com a crescente demanda por veículos elétricos, as empresas multinacionais intensificaram a pressão para controlar as reservas de lítio da Bolívia. O golpe de 2019 foi um golpe de Estado apoiado pelos Estados Unidos e pela direita boliviana. Os golpistas, liderados por Luis Fernando Camacho, prometeram revogar a política de exploração do lítio sob controle estatal, o que não aconteceu.

Milanez aponta que embora o Brasil tenha potencial para se tornar um importante player na indústria de lítio, é fundamental que o país enfrente essas questões de maneira estratégica e sustentável. Isso implica em um diálogo aberto com as comunidades locais, a implementação de práticas responsáveis de mineração e a consideração de como o lítio pode contribuir para a transição energética e o desenvolvimento nacional. O pesquisador afirma que o país parece carecer de um debate nacional sobre a nacionalização do lítio, enquanto países vizinhos como Bolívia e Chile já discutem a importância de garantir que os benefícios dessa riqueza mineral retornem às suas populações.

“O Brasil simplesmente não existe essa discussão de como garantir que esse lítio eventualmente seja usado de alguma forma para beneficiar o país, a não ser simplesmente exportar” afirma o pesquisador.

A exploração de lítio na América do Sul é um exemplo notável das complexidades enfrentadas pelo Sul Global ao desempenhar um papel vital na transição para um futuro mais sustentável. A busca pelo “ouro branco” deve ser conduzida com responsabilidade, mantendo o equilíbrio entre o progresso econômico, a preservação do meio ambiente e o respeito pelos direitos das comunidades locais.

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração

O post Sustentável para quem? O Lítio Brasileiro: A Promessa da Transição Energética e a Insustentabilidade Socioambiental apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/11/24/sustentavel-para-quem-o-litio-brasileiro-a-promessa-da-transicao-energetica-e-a-insustentabilidade-socioambiental/feed/ 0
MAM e Fiocruz Lançam Livro “O Problema Mineral no Ceará – Vol 1: Onde Não Tem Mineração no Ceará?” https://www.mamnacional.org.br/2023/11/23/mam-e-fiocruz-lancam-livro-o-problema-mineral-no-ceara-vol-1-onde-nao-tem-mineracao-no-ceara/ https://www.mamnacional.org.br/2023/11/23/mam-e-fiocruz-lancam-livro-o-problema-mineral-no-ceara-vol-1-onde-nao-tem-mineracao-no-ceara/#respond Thu, 23 Nov 2023 19:39:24 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3801 O Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), tem a honra de anunciar o lançamento do livro “O Problema Mineral no Ceará – Vol 1: Onde Não Tem Mineração no Ceará?”. O evento acontecerá no Auditório da Reitoria da Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, no dia […]

O post MAM e Fiocruz Lançam Livro “O Problema Mineral no Ceará – Vol 1: Onde Não Tem Mineração no Ceará?” apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
O Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), tem a honra de anunciar o lançamento do livro “O Problema Mineral no Ceará – Vol 1: Onde Não Tem Mineração no Ceará?”. O evento acontecerá no Auditório da Reitoria da Universidade Federal do Ceará, em Fortaleza, no dia 23 de novembro de 2023.

O livro, escrito por Erivan Silva e Pedro D’ Andrea, membros da Direção Nacional do MAM, é o primeiro volume da coleção “O Problema Mineral Cearense”. A obra busca sistematizar as formulações acerca do Problema Mineral Brasileiro, especificamente no contexto do Ceará, destacando os desafios enfrentados pela população diante da expansão acelerada do setor mineral no estado.

Pedro D’Andrea, dirigente nacional do MAM e um dos organizadores da coleção, destaca a importância da obra, afirmando: “Este primeiro volume da coleção deverá cumprir três objetivos centrais: ser um material produzido pelo Movimento para a classe trabalhadora, universidades e comunidades, demonstrar a importância das universidades cearenses em colocar definitivamente a mineração como agenda de pesquisa, e compartilhar ideias para disputar a subjetividade da classe trabalhadora historicamente capturada pelo capital mineral.”

A coleção “O Problema Mineral Cearense” questiona a presença da mineração no estado do Ceará, explorando desde o litoral ao sertão, de leste a oeste, os desafios e impactos desse setor. A obra apresenta uma análise crítica da inserção do Brasil na divisão internacional do trabalho, destacando as contradições do modelo de mineração, que concentra grandes proporções de terra, água, subsolo e trabalho precarizado.

A publicação aborda diversas discussões fundamentais relacionadas ao setor mineral no Ceará, fornecendo uma análise abrangente e crítica. Examina a dinâmica histórica da mineração no estado, destacando as transformações e impactos ao longo das décadas. Além disso, explora a interseção entre o setor mineral e a crise sanitária, especialmente durante a pandemia de Covid-19, evidenciando as complexas ramificações dessa relação.

O texto também discute o impacto socioeconômico do setor, enfocando questões como o aumento do preço dos minérios e a desvalorização da moeda, assim como a concentração de renda e a precarização do trabalho no âmbito da mineração. Ao abordar os conflitos por água relacionados à atividade mineradora, o livro lança luz sobre as questões ambientais e sociais inerentes a essa indústria. Além disso, destaca o papel crucial das universidades na pesquisa e formulação de um novo modelo de mineração mais sustentável e socialmente responsável.

Detalhes do Lançamento:

Nome do Livro: O Problema Mineral no Ceará – Vol 1: Onde Não Tem Mineração no Ceará?

Realização: MAM e Fiocruz

Data: 23 de novembro de 2023

Local: Auditório da Reitoria da Universidade Federal do Ceará, Av. Treze de Maio, 2081 – Benfica, Fortaleza – CE, 60040-531

Mesa: Ary Miranda (Médico, professor da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz), Patrícia Gomes (Militante do MAM, Assentamento Queimadas – Santa Quitéria-CE), Erivan Silva (Coordenação Nacional do MAM, graduado em Ciências Sociais e Mestre em Geografia)

Para mais informações, entre em contato com nossa Assessoria de Comunicação no número: (91)980879591

Publicação em PDF: https://drive.google.com/file/d/1xYk5uipsaMgrRSTJn18eD4MDEiXfOD8D/view?usp=sharing

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração

O post MAM e Fiocruz Lançam Livro “O Problema Mineral no Ceará – Vol 1: Onde Não Tem Mineração no Ceará?” apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/11/23/mam-e-fiocruz-lancam-livro-o-problema-mineral-no-ceara-vol-1-onde-nao-tem-mineracao-no-ceara/feed/ 0
O agromineral in natura que satisfaz o capital e destrói povos e natureza no Pará https://www.mamnacional.org.br/2023/11/08/o-agromineral-in-natura-que-satisfaz-o-capital-e-destroi-povos-e-natureza-no-para/ https://www.mamnacional.org.br/2023/11/08/o-agromineral-in-natura-que-satisfaz-o-capital-e-destroi-povos-e-natureza-no-para/#respond Wed, 08 Nov 2023 16:57:32 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3773 Marabá(PA) – A espera pela passagem do trem da Vale S.A levando minério de ferro pode levar até 15 minutos – Alexandra Duarte (tramateia.pro)   Por Marcio Zonta   Destas questões, pela saúde e pela economia amazônica e por síntese, paraense, é uma imposição de fora para dentro, alheia e estranha ao seu povo, tanto num […]

O post O agromineral in natura que satisfaz o capital e destrói povos e natureza no Pará apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
Marabá(PA) – A espera pela passagem do trem da Vale S.A levando minério de ferro pode levar até 15 minutos – Alexandra Duarte (tramateia.pro)

 

Por Marcio Zonta

 

Destas questões, pela saúde e pela economia amazônica e por síntese, paraense, é uma imposição de fora para dentro, alheia e estranha ao seu povo, tanto num sentido nacional centro – sul, quanto no ritmo de despossessão internacional. A grosso modo, são combatidos todas formas econômicas que tem a verve paraense baseada na natureza, ou seja, aquelas que pertencem a pluralidade cultural de seu povo e que teria harmonia com a floresta.,

Sobressaem a essa cultura regional econômica, pelo menos nos últimos 60 anos, com um estado de exceção implantado pelos militares e a famigerada elite brasileiro anti povo; a colonização e acentuação da exploração de comodities minerais e agrícolas regida pela força opressora do Estado, nas novas leis (exceção) e na dominação territorial.

A mineração e o agronegócio estão engendrados numa mesma lógica. Dos investimentos da mineração previstos até 2027 divulgados pelo Instituto Brasileiro de Mineração -IBRAM, o maior volume será direcionado ao minério de ferro: US$ 17 bilhões, ou 24% a mais do que no período anterior (2022-2027); o cobre receberá US$ 4,5 bilhões (255% a mais); o níquel receberá US$ 2,3 bilhões (60% a mais). Ouro terá decréscimo: US$ 2,8 bilhões (-2%); idem para bauxita que receberá investimentos de US$ 5 bilhões (-11%); minérios de fertilizantes, que receberão US$ 5,2 bilhões (-9%); zinco, que receberá US$ 113 milhões (-53%). Investimentos em logística totalizarão até 2027 US$ 4,4 bilhões

A maioria dos minerais citados acimas, são retirados em bastante volume no Pará, caso do Ferro, Cobre, Níquel e Bauxita…Por isso, na divulgação, o IBRAM, informa que o Pará será um dos mais contemplados pelos investimentos do setor, US$ 13,9 bilhões, seguidos por Minas Gerais: US$ 11,44 bilhões e Bahia: US$ 10,24 bilhões.

Minérios in natura, que além de agudizar as desigualdades, leva nosso projeto nacional (Ciência, tecnologia, inteligência profissional, indústria mineral, desenvolvimento econômico…) a se realizar em outra parte do globo, nesse caso, a China.

A agronegócio envenenador vem casado com esse projeto mineral in natura. Entre as culturas agrícolas, a produção de soja e milho teve crescimento em 2022; 11,7% e 19,2%, respectivamente. A pesquisa divulgada pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB), mostra que a safra de soja aumentou de 2,497 milhões de toneladas de 2021 para 2,790 milhões de toneladas em 2022.

Os dados indicam que também houve um avanço no número de área plantada. O Pará conta atualmente com 1,5 milhão de hectares de plantio, cerca de 10% a mais do que na última safra, quando a área produtiva era de 1,3 milhão de hectares. Essas áreas não param de crescer e desestabilizar e vulnerabilizar territórios.

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração

 

Matéria originalmente publicada no Jornal resistência – Sociedade paraense de defesa dos direitos humanos

O post O agromineral in natura que satisfaz o capital e destrói povos e natureza no Pará apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/11/08/o-agromineral-in-natura-que-satisfaz-o-capital-e-destroi-povos-e-natureza-no-para/feed/ 0
Documento aponta ilegalidades em projeto de terminal de gás em Barcarena – PA https://www.mamnacional.org.br/2023/11/07/documento-aponta-ilegalidades-em-projeto-de-terminal-de-gas-em-barcarena/ https://www.mamnacional.org.br/2023/11/07/documento-aponta-ilegalidades-em-projeto-de-terminal-de-gas-em-barcarena/#respond Tue, 07 Nov 2023 19:02:40 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3776 Após empreendimento não fazer consulta prévia, invisibilizar comunidades tradicionais e apresentar inconsistência na avaliação dos impactos aos pescadores, cientistas pedem suspensão do licenciamento ambiental do terminal de gás em Barcarena (PA).   Um relatório de pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) identifica irregularidades e recomenda suspensão do processo de licenciamento ambiental do Terminal de […]

O post Documento aponta ilegalidades em projeto de terminal de gás em Barcarena – PA apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
Após empreendimento não fazer consulta prévia, invisibilizar comunidades tradicionais e apresentar inconsistência na avaliação dos impactos aos pescadores, cientistas pedem suspensão do licenciamento ambiental do terminal de gás em Barcarena (PA).

 

Um relatório de pesquisadores da Universidade Federal do Pará (UFPA) identifica irregularidades e recomenda suspensão do processo de licenciamento ambiental do Terminal de Gás Natural Liquefeito (GNL), da empresa Termogás, em Barcarena. Na próxima quinta-feira, dia 9, está marcada uma audiência pública no município, na Vila dos Cabanos, sobre os impactos ambientais do projeto para movimentação de gás natural na região. O Ministério Público Federal (MPF) já instaurou procedimento sobre o caso.

O Terminal GNL está planejado para ocupar parte do território do Conde, onde vivem comunidades tradicionais, pressionadas por cerca de 50 empresas de mineração, agronegócio, fertilizantes e logística instaladas em área que passou a ser chamada Distrito Industrial. Nos últimos 20 anos, segundo o estudo, ao menos 15 desastres foram registrados ali, gerando impactos socioambientais cumulativos.

A presença da Termogás na região atenderia interesses comerciais e de imagem da Hydro/Alunorte, que pretende substituir o óleo diesel e o coque de petróleo no processo de produção do alumínio por gás líquido natural. Com vistas à COP-30, o governo do Pará adota discurso de estímulo a uma ‘economia verde’, mas desconsidera os direitos sociais e territoriais das populações tradicionais.

“O projeto da Termogás faz parte de um projeto maior, tanto do governo do estado quanto das empresas, de criar uma imagem verde em torno do beneficiamento de minérios, da produção de soja e de dendê. O gás vai ser destinado para a produção de alumina e alumínio para exportação, uma indústria que é pautada pela destruição e poluição. E que vai continuar poluindo, mas vai lucrar mais com essa ideia de ‘alumínio verde’, que não existe. Infelizmente, as comunidades vão ficar mais impactadas, porque continua a poluição, há mais risco de desastres, menos território com cobertura vegetal, menos possibilidade de retomar suas vidas tradicionais”, avalia o professor Marcel Hazeu, coordenador do relatório.

De acordo com os cientistas, não foi feita a obrigatória consulta prévia aos povos e comunidades tradicionais das áreas diretamente afetadas pelo Terminal GNL, no caso, Barcarena e Abaetetuba (PA). A consulta prévia, definida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), avalia se há consentimento das comunidades para a instalação do empreendimento. O documento aponta ainda inconsistência quanto ao número indicado de comunidades afetadas.

“Teve uma reunião em que eles falaram que o Acuí não existe mais. Mas nós estamos aqui, estamos resistindo. As empresas vão chegando, vão espremendo a gente, vão tirando as pessoas. Nós temos o direito de ser consultados e esse direito não está sendo considerado pra gente. É por isso que nós estamos nessa luta”, afirma João Dias dos Santos, presidente da Associação dos Trabalhadores Rurais do Acuí.

No levantamento da UFPA, é citada incoerência no estudo e no relatório de impacto ambiental apresentados para o licenciamento do Terminal GNL. Diferentemente do que a empresa alega, as restrições à atividade pesqueira não seriam temporárias, mas permanentes.

“Eu queria saber quais são os impactos diretos na pesca, na sobrevivência dos peixes”, diz Valdomiro dos Santos, pescador há 40 anos e presidente da Associação de Famílias Tradicionais do Curuperé.

Os pesquisadores recomendam que o caso saia da competência estadual e passe para o âmbito federal. Um dos motivos é que o governo do Pará, antes de qualquer análise, apresenta, no Plano Estadual de Atração de Negócio, o empreendimento da Termogás como de interesse público. Além disso, o Terminal GNL teria reverberações no rio Tocantins, alcançando bacias e microbacias de diferentes estados.

“Nós sabemos que todos os empreendimentos que chegam trazem uma quantidade muito grande de prejuízo pra nossa comunidade. E pro meio ambiente também. O território do Conde é habitado por povos tradicionais. Então está na hora da gente se levantar. Nós não queremos mais um empreendimento na nossa região. A gente precisa dar um basta, a gente já está cansado disso”, conta Euniceia Rodrigues, da Associação de Moradores de Canaã e Maricá.

Um termo de compromisso firmado entre o MPF, o Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), a Companhia de Desenvolvimento Econômico do Pará (Codec) e o estado do Pará, em 2016, definiu que o estado deveria fazer, em 18 meses, o licenciamento ambiental para o Distrito Industrial. Até hoje, o processo de licenciamento integral do polo não foi realizado.

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração

 

O post Documento aponta ilegalidades em projeto de terminal de gás em Barcarena – PA apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/11/07/documento-aponta-ilegalidades-em-projeto-de-terminal-de-gas-em-barcarena/feed/ 0
Um Ano de Resistência Contra a BAMIN: A Ocupação da BA-156 https://www.mamnacional.org.br/2023/09/26/um-ano-de-resistencia-contra-a-bamin-a-ocupacao-da-ba-156/ https://www.mamnacional.org.br/2023/09/26/um-ano-de-resistencia-contra-a-bamin-a-ocupacao-da-ba-156/#respond Tue, 26 Sep 2023 21:31:02 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3752 Há um ano comunidades de Riacho Fundo, Barreiro, Barreiro do Mato, Taquaril dos Fialhos, Boiada, Brejo e São Domingos do estado da Bahia, se uniram contra a BAMIN. Por Ananda Ridart   Na beira da BA-156, um corajoso ato de resistência começou a tomar forma. As comunidades de Riacho Fundo, Barreiro, Barreiro do Mato, Taquaril […]

O post Um Ano de Resistência Contra a BAMIN: A Ocupação da BA-156 apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
Há um ano comunidades de Riacho Fundo, Barreiro, Barreiro do Mato, Taquaril dos Fialhos, Boiada, Brejo e São Domingos do estado da Bahia, se uniram contra a BAMIN.

Por Ananda Ridart

 

Na beira da BA-156, um corajoso ato de resistência começou a tomar forma. As comunidades de Riacho Fundo, Barreiro, Barreiro do Mato, Taquaril dos Fialhos, Boiada, Brejo e São Domingos do estado da Bahia, se uniram para enfrentar a mineradora Bahia Mineração Ltda (BAMIN) e suas operações de mineração que trouxeram uma série de problemas e impactos devastadores para suas vidas.

2006: O Nascimento da BAMIN

A BAMIN surge em 2006, após a descoberta da mina Pedra de Ferro, uma mina rica em minério de ferro que se tornaria o epicentro de uma série de conflitos e problemas. A empresa é controlada pela Eurasian Resources Group (ERG), do Cazaquistão.

2008: Início das Desapropriações

Dois anos depois, em 2008, a BAMIN iniciou um processo de desapropriação que afetou diretamente 18 famílias, totalizando 52 pessoas, nas comunidades quilombolas de Antas e Palmito, nos municípios de Caetité e Pindaí.

A partir desse momento, as consequências da BAMIN começaram a afetar dezenas de comunidades por anos, causando problemas como poeira constante, resíduos de minério de ferro que prejudicou a agricultura, a saúde das pessoas e até explosões que causaram rachaduras nas casas. Além disso, a empresa fazia uso indiscriminado da água, ameaçando os recursos hídricos da região.

26 de setembro de 2022: Início da Ocupação

O ponto de partida foi a ocupação da rodovia BA-156 em Licínio de Almeida. Essas comunidades exigiram uma audiência pública com a BAMIN para obter esclarecimentos sobre o uso da rodovia no transporte de minério. A BAMIN não havia previsto essa atividade em seu projeto de exploração da mina Pedra de Ferro. As consequências eram claras: poeira, resíduos de minério assentando nas lavouras, doenças respiratórias, rachaduras nas casas e ameaça ao abastecimento de água potável.

13 de outubro de 2022: Manifesto dos Movimentos Sociais

 Menos de um mês após o início do acampamento, movimentos sociais emitiram um manifesto em apoio às comunidades. As vozes se uniram em uma denúncia coletiva dos abusos e violações da BAMIN, exigindo justiça e reparação.

24 de outubro de 2022: Ocupação dos Trilhos do Trem

A população ocupou os trilhos do trem que transportava minério na região, bloqueando seu fluxo por 30 horas. Os moradores de Licínio de Almeida estavam determinados a fazer sua voz ser ouvida. A rota de escoamento do minério de ferro explorado pela BAMIN ia de Brejinho das Ametistas até Licínio de Almeida. A população exigia um diálogo imediato da empresa e do Estado para resolver as sérias violações denunciadas pelas famílias trabalhadoras e organizações.

4 de janeiro de 2023: Tentativa de Remoção sem Acordo

A pressão não cessou. Em janeiro de 2023, houve tentativas de remoção forçada, mas a população permaneceu firme.

13 de janeiro de 2023: Reunião com SEINFRA e Início da Desocupação

Finalmente, em 13 de janeiro de 2023, uma reunião com a Secretaria de Estado de Infraestrutura (SEINFRA) abriu caminho para o início da desocupação.

Ainda em janeiro de 2023: Ocupação da BA-210

Enquanto a luta em Licínio de Almeida continuava, comunidades de Sento Sé, no norte da Bahia, também se levantavam. Elas ocuparam trechos da BA-210 em protesto contra os impactos do Tombador Iron Mineração, que planejava explorar minério de ferro na Serra da Bicuda, afetando comunidades tradicionais ribeirinhas e de fundo de pasto.

26 de setembro de 2023: Um Ano Após o Início da Ocupação

Um ano após o início da ocupação na BA-156, as comunidades alcançaram algumas vitórias. O número de caminhões transportando minério foi reduzido, eles passaram a ser cobertos com lona e tiveram suas velocidades diminuídas, com fiscalização rigorosa. A SEINFRA se comprometeu com o asfaltamento da rodovia. Essas conquistas demonstram que a resistência é eficaz.

“Mas a principal vitória do acampamento na BA-156 foi a demonstração de que é possível o povo, organizado e mobilizado, reivindicar seus direitos e diante de uma mineradora, ainda que gigante. O povo pode decidir sobre a mineração. Essa foi uma experiência importantíssima para Licínio de Almeida e um exemplo para todas as outras populações que vivem em contradição com a mineração”, destacou Ione Rochael, militante do MAM que esteve nas ocupações.

Em meio aos desafios e conquistas, a jornada contra a BAMIN continua. O Movimento pela Soberania Popular na Mineração permanecerá engajado e incansável na defesa dos direitos das comunidades afetadas e na busca por justiça ambiental. Unidos, continuaremos a trilhar o caminho da resistência, da esperança e da construção de um futuro mais justo para todos.

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração

O post Um Ano de Resistência Contra a BAMIN: A Ocupação da BA-156 apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/09/26/um-ano-de-resistencia-contra-a-bamin-a-ocupacao-da-ba-156/feed/ 0
Seminário “Reestruturação e Reconfiguração de Classes: Desafios estratégicos” é realizado em Guanambi no dia 20 https://www.mamnacional.org.br/2023/09/21/seminario-reestruturacao-e-reconfiguracao-de-classes-desafios-estrategicos-e-realizado-em-guanambi-no-dia-20/ https://www.mamnacional.org.br/2023/09/21/seminario-reestruturacao-e-reconfiguracao-de-classes-desafios-estrategicos-e-realizado-em-guanambi-no-dia-20/#respond Thu, 21 Sep 2023 20:51:38 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3682 Nesta quarta-feira (20/09), ocorreu o seminário “Reestruturação e Reconfiguração de Classes: Desafios estratégicos- saúde, território, mineração e o papel da ciência e pesquisa”, no Campus XII da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Guanambi-BA. A atividade foi construída pelo Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM), a Cáritas Regional Nordeste 3, a Cáritas Diocesana de Caetité, a […]

O post Seminário “Reestruturação e Reconfiguração de Classes: Desafios estratégicos” é realizado em Guanambi no dia 20 apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
Nesta quarta-feira (20/09), ocorreu o seminário “Reestruturação e Reconfiguração de Classes: Desafios estratégicos- saúde, território, mineração e o papel da ciência e pesquisa”, no Campus XII da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Guanambi-BA. A atividade foi construída pelo Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM), a Cáritas Regional Nordeste 3, a Cáritas Diocesana de Caetité, a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e da UNEB Campus XII.

O encontro contou com a presença de cerca de 100 pessoas, entre professores e estudantes dos cursos de enfermagem, administração, pedagogia, geografia e engenharia de minas. Estiveram presentes também alunos das Escolas Famílias Agrícolas (EFA) de Licínio de Almeida e Riacho de Santana, além de lideranças comunitárias e representações dos mandatos do deputado estadual Hilton Coelho (PSOL) e do vereador Paulo Costa (PCdoB).

O seminário buscou fazer o debate sobre os impactos de ordem ambiental, na saúde e aos trabalhadores, gerados pela mineração na região dos municípios de Guanambi, Caetité, Licínio de Almeida e Pindaí. Essa região é impactada principalmente pelo projeto Pedra de Ferro da Bahia Mineração (BAMIN), onde há uma demanda de investigação independente sobre a atividade na região. Esse cenário preocupante se reproduz em grande parte do estado, como pontua Adrielly Régis, Enfermeira e militante do MAM:

“Mais da metade dos municípios da Bahia estão com projetos de mineração ativos. Essa realidade produz diversos danos à saúde das comunidades e à saúde dos/as trabalhadores/as. Diante desse cenário é possível afirmar que o modelo de mineração atual é um problema de saúde pública.”

Adrielly Régis, militante do MAM. Foto: Ione Rochael – MAM.

Ary Miranda, médico e professor da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, em sua fala analisou vários aspectos do atual modelo econômico vigente no mundo, o capitalismo, e como seu modus operandi visa expropriar cada vez mais a classe trabalhadora de direitos e, consequentemente, dos seus territórios. De forma dialética, ressaltou a importância de entendermos que “não tem como pensar mineração aqui, só pensando aqui”, já que a mineração predatória não é uma problemática isolada de cada região onde chega, logo precisamos entender esses avanços do grande capital internacional sobre nossas riquezas naturais.

Ary Miranda, FIOCRUZ. Foto: Helenna Castro – CPT SSO

O professor coordena o Projeto “Mineração e impacto socioambiental”, que é resultado de uma colaboração entre o Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM) e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com a Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS) e tem como objetivo ampliar o entendimento dos impactos socioambientais provocados pela atividade mineradora nos territórios minerados, para a classe trabalhadora do setor e população impactada.

A programação do seminário ocorreu durante todo o dia. Pela manhã foi apresentado o debate sobre reconfiguração do mundo do trabalho, sobre saúde e mineração e os desafios da região diante da expansão da atividade mineradora. Beniézio Carvalho, agente da CPT sub-regional Sul-sudoeste da Bahia, pontua que “com a chegada da BAMIN, aprofundou-se a especulação mineral” nos municípios do chamado “alto sertão” do estado e teve impactos nos modos de vida de diversas populações, principalmente rurais.

Beniézio Carvalho, agente pastoral. Foto: Helenna Castro. CPT Sul-Sudoeste.

Antônio, morador da comunidade de Cubículo, em Pindaí, ao falar sobre como as mineradoras agem ao chegar a um território, conta que “Onde eles passam, eles passam procurando as pessoas individual, nao aceita a coletividade. Individualiza as pessoas, o problema é coletivo e vai acertando com cada um e quando chega em um que não querer, eles passam por cima.” A liderança comunitária afirma que “nós precisamos fazer esse enfrentamento e fazer um plano de ação para que outras comunidades não sejam atingidas com essa mineradora que porventura vai vir”. O agricultor lembra também sobre a importância de lembrarmos que também existe na região o avanço da instalação de parques eólicos, que muito são prejudiciais para as comunidades de seu entorno.

Leila, que cresceu na comunidade de Taquaril dos Fialhos, em Licinio de Almeida, convoca os estudantes a pesquisar mais sobre a questão mineral na região pois “não basta só a gente falar, parece que precisa ter o documento institucionalizado reconhecendo a nossa tradicionalidade [fundo e fecho de pasto], o nosso direito de viver no território sem mineração.” Relembra também que mesmo no contexto da pandemia, embora na comunidade vivam muitos idosos, “a empresa [Vale do Paramirim], começou a intensificar o assédio e chegou ao ponto do próprio João Cavalcanti [presidente] ir à comunidade ameaçar, intimidar”.

Leila Lobo da comunidade Taquaril dos Fialhos e Antônio do Cubículo. Foto: Helenna Castro – CPT SSO.

À tarde, a professora e doutoranda em Geografia pela UFS (Universidade Federal de Sergipe), Fernanda Rodrigues, falou sobre sua tese “Desafios teórico-metodológicos e possibilidades de investigação científica nos territórios em conflito com a mineração no Centro-sul baiano”. Na apresentação, a profª apresentou dados sobre o Projeto Pedra de Ferro, quais são as principais dificuldades na coleta dessas informações e qual o papel da pesquisa na luta em defesa dos territórios em que a mineração predatória chega.

Mesa com Venício Montalvão (MAM), Manoel Alves (UNEB) e Fernanda Oliveira (UFS). Foto: Helenna Castro – CPT SSO.

Contamos também com a exposição do Profº Dr. Manoel Alves, que leciona no curso de Geografia da UNEB Campus XII, sobre os impactos da exploração mineral sobre nossa biodiversidade e ecossistemas.

Prof. Dr. Manoel Alves (UNEB). Foto: Helenna Castro – CPT SSO.

Além disso, foi apresentado proposta de trabalho de pesquisa a ser desenvolvido, a metodologia e os objetivos para investigação dos impactos da mineração no território, ficando encaminhado a continuidade da articulação e discussão sobre a pesquisa.

Conteúdo colaborativo:

Seminário “Reestruturação e Reconfiguração de Classes: Desafios estratégicos” é realizado em Guanambi no dia 20

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração

O post Seminário “Reestruturação e Reconfiguração de Classes: Desafios estratégicos” é realizado em Guanambi no dia 20 apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/09/21/seminario-reestruturacao-e-reconfiguracao-de-classes-desafios-estrategicos-e-realizado-em-guanambi-no-dia-20/feed/ 0
O II Intercâmbio de Agroecologia e Soberania Popular da Chapada Diamantina aconteceu entre os dias 7 a 9 de setembro. https://www.mamnacional.org.br/2023/09/15/o-ii-intercambio-de-agroecologia-e-soberania-popular-da-chapada-diamantina-aconteceu-entre-os-dias-7-a-9-de-setembro/ https://www.mamnacional.org.br/2023/09/15/o-ii-intercambio-de-agroecologia-e-soberania-popular-da-chapada-diamantina-aconteceu-entre-os-dias-7-a-9-de-setembro/#respond Sat, 16 Sep 2023 01:00:09 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3651 O II Intercâmbio de Agroecologia e Soberania popular da Chapada Diamantina abordou através de atividades de leitura, música, poesia, amostra de filmes a conscientização ambiental e mesas de discussão sobre os impactos da expansão de atividades de mineração na região.

O post O II Intercâmbio de Agroecologia e Soberania Popular da Chapada Diamantina aconteceu entre os dias 7 a 9 de setembro. apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
Realizado entre os dias 7 a 9 de setembro na comunidade de Colônia do INCRA, em Itaeté – BA, o II Intercâmbio de Agroecologia e Soberania Popular da Chapada Diamantina abordou através de atividades de leitura, música, poesia, mostra de filmes para conscientização ambiental e mesas de discussão sobre os impactos da expansão de atividades de mineração na região.

Na tarde do dia 08 de setembro, o MAM – Movimento pela Soberania Popular na Mineração compôs a mesa “O mapa da mineração na Chapada Diamantina” junto ao Geografar, representado pela pesquisadora Valdirene. O objetivo da mesa foi denunciar o avanço da mineração que vem avançando sem consultar às comunidades da Chapada Diamantina. Com base nas discussões da mesa, concluiu-se que a mineração precisa servir às necessidades do povo e que é preciso discutir a questão dos trabalhadores e trabalhadoras que são explorados e mutilados a cada hora pela mineração. Para Jaine Miranda, militante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração:

“A mineração não está pautada no interesse das comunidades e famílias do campo, causa o inchaço das cidades, o aumento da criminalidade. Este modelo de mineração, subordinado aos interesses da burguesia mineral, não promove a vida, não promove o desenvolvimento, a mineração neste modelo sem discussão popular, não promove a elaboração de políticas públicas para o campo, sendo assim, a agricultura não pode existir em conjunto com a atividade minerária”, afirma Miranda.

É preciso exercer o poder popular dentro deste modelo mineral, que segundo Valdirene, vem mapeando todo o território da Bahia impactada pela mineração. Esse modelo cria uma falsa narrativa de que só a mineração pode salvar a economia do estado. As facilitadoras do debate ressaltaram a importância dos movimentos sociais e da organização popular na construção de espaços formativos que fortaleçam a unidade do povo e de assembleias onde o poder popular seja exercido.

O intercâmbio também recebeu Marcelino Galo, Engenheiro Agrônomo e defensor do Meio Ambiente e da Agroecologia, que pontou os debates sobre o processo minerário que vem ameaçando o território da Chapada Diamantina. Em sua fala, Marcelino reforça a importância da aliança dos movimentos sociais com as comunidades chapadenses, em especial, o Movimento pela Soberania Popular na Mineração. Nas palavras dele, tendo em vista as experiências e ações, o MAM pode contribuir de forma significativa nas percepções e organização sobre problemáticas que são trazidas e intensificadas a partir de um empreendimento minerador invasivo, a exemplo dos possíveis embates por água em um território com potencial hídrico pela grande quantidade de nascentes e rios. 

“A exploração minerária é muito brutal ao explorar o meio ambiente de forma predadora, e os impactos sobre as comunidades são violentos no sentido da saúde das pessoas, dos bens naturais ali presentes, a disputa pela água, as explosões, a poeira que vem com o transporte do minério”, explica Galo.

No último dia da programação foi promovida uma visita à antiga instalação da Escola Família Agrícola de Colônia do Incra (EFACI). Na oportunidade do encontro, Vera, professora de Educação do Campo e uma das mediadoras do intercâmbio que já atuou no corpo docente da escola no período de funcionamento, relata a importância da organização da comunidade, em especial frente às tentativas de tornar a Serra da Chapadinha um território minerado, que a comunidade se posiciona como contrária, além de protestar sobre o desamparo com a escola.

Fechada desde o ano de 2017, a escola que antes era formadora de base, de jovens camponeses de diversos municípios, hoje se encontra em situação de abandono financeiro e consequentemente do espaço físico. Segundo relatos da comunidade, seu fim implica diretamente na saída dos jovens do povoado, aumentando os índices do êxodo rural e também uma redução das perspectivas locais. Para além do fechamento da EFACI, foi debatida também a questão minerária que se aproxima cada vez mais no território da Chapadinha. Vera relata que tal problemática já é uma realidade na comunidade e que encontros como esses servem para fortalecer e organizá-los para combater esse “mal”.

“Um dos problemas que a gente está vendo acontecendo na nossa comunidade aqui na Chapadinha, é a questão da mineração, a mineração vai trazer muitas questões para a nossa comunidade, o desmatamento, as pessoas que já vivem nas margens da sociedade, vai ficar muito pior, com base de exemplos de outras localidades, que já aconteceu pior, então, esse momento é um momento ímpar, para que a comunidade se sinta fortalecida para lutar contra esse mal”, conclui Vera.

Portanto, o II Intercâmbio de Agroecologia da Chapada Diamantina reforçou ainda mais a união que essas comunidades vêm realizando contra os projetos miner´ários que surgem em suas localidades, uma vez que tais projetos ameaçam o território da Chapada Diamantina em esferas sociais, ambientais e sociais. São realizações como essas que se propõem a estimular a soberania do povo, para que os mesmos tenha a voz e vez para decidir sobre seius territórios de forma organizada. As atividades foram realizadas com mística, poesia e cantigas de rodas advindas das comunidades que fazem parte da Chapada, trazendo o protagonismo das mulheres no enfrentamento ao modelo mineral predatório.

 

 

Movimento pela Soberania Popular na Mineração

 

O post O II Intercâmbio de Agroecologia e Soberania Popular da Chapada Diamantina aconteceu entre os dias 7 a 9 de setembro. apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/09/15/o-ii-intercambio-de-agroecologia-e-soberania-popular-da-chapada-diamantina-aconteceu-entre-os-dias-7-a-9-de-setembro/feed/ 0
Mulheres são as mais impactadas pela mineração https://www.mamnacional.org.br/2023/09/15/artigo-mulheres-sao-as-mais-impactadas-pela-mineracao/ https://www.mamnacional.org.br/2023/09/15/artigo-mulheres-sao-as-mais-impactadas-pela-mineracao/#respond Fri, 15 Sep 2023 23:54:30 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3637 As mulheres são impactadas pela mineração tanto como trabalhadoras no setor, quanto sofrendo as consequências diretas dos crimes da atividade.

O post Mulheres são as mais impactadas pela mineração apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
As mulheres são impactadas pela mineração tanto como trabalhadoras no setor, quanto sofrendo as consequências diretas dos crimes da atividade. 

Por Ananda Ridart

 

Ano passado foi compartilhado um cartaz de um bingo destinado a garimpeiros, entre os prêmios estava uma mulher, 50 gramas de ouro e objetos. O bingo foi divulgado em um grupo de WhatsApp chamado “Amigos do Rio Uraricoera”, referência a principal via fluvial usada pelo garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami, nas mensagens constava entre os prêmios uma mulher como um objeto de consumo, “Na quina uma mulher, na quadra um relógio masculino”.

Essa é apenas uma das facetas dos impactos da mineração na vida das mulheres, porém as mulheres impactada pela mineração, sofrem de diversas violências complexas que surgem através da transformação social da chegada de um empreendimento minerário em um território. De acordo com o Mapa da Violência Contra as Mulheres (2012), os sete principais estados mineradores (Pará, Minas Gerais, Bahia, Goiás, Maranhão, Piauí e São Paulo) correspondem a 31,2% dos casos de violência do país contra as mulheres. Em 2016, os dados da Polícia Civil da cidade de Parauapebas, no Pará, apontavam que aproximadamente 80% dos casos de violência contra as mulheres vinham de funcionários da Vale, pelo alto grau de estresse do trabalho na mineradora.

São as mulheres que mais sofrem com o aumento do trabalho doméstico quando a poeira mineral invade as suas casas e adoece os seus filhos, são elas que são mais vulneráveis diante da violência sexual, do tráfico humano e da prostituição. Diante desse cenário, há mulheres espalhadas por todo o território brasileiro organizadas, lutando e resistindo ao avanço predatório da mineração, mesmo que os espaços de decisão e de lideranças políticas ainda sejam majoritariamente masculinos.

A socióloga Iara Reis compreende que para além disso, os homens possuem uma relação diferente com o território e quando os grandes projetos minerários chegam, eles acabam visando o lucro e o trabalho como principal preocupação. Se ‘encantam’ com a possibilidade de conseguir ter mais ganhos, enquanto são as mulheres que olham de forma mais crítica aos impactos, afinal são elas que acabam sobrecarregadas com as atividades de cuidado com o lar e com os filhos.

“Visitávamos territórios minerários em um projeto que participei da Fiocruz. Nas visitas, os homens falavam em reuniões sobre os pontos positivos da mineração e as mulheres ficavam o encontro caladas. Quando acabava, elas me chamavam no privado e relatavam a existência da poluição, onde as casas não param limpas, o adoecimento das crianças, o aumento da prostituição, do assédio, estupro e violência doméstica. Esse é o ponto de convergência entre os locais com mineração”, relata a socióloga.

No outro lado da mineração 

As mulheres encaram situações muito difíceis, seja combatendo as mineradoras ou trabalhando para elas. A mulher trabalhadora na mineração ainda é bastante desvalorizada. Elas recebem menos que os homens, mesmo trabalhando a mesma quantidade com turnos de dez horas. Normalmente não possuem local apropriado para urinar e acabam sofrendo de casos de incontinência urinária. As trabalhadoras que manuseiam equipamentos no horário noturno são colocadas em situações inseguras sem iluminação.

“A nossa luta não é contra a trabalhadora, mas ao contrário, é para garantir direitos, como o caso de mulheres que trabalham na Vale e não recebem igual aos homens”, comenta a socióloga.

Movimentio Pela Soberania Popular na Mineração

 

O post Mulheres são as mais impactadas pela mineração apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/09/15/artigo-mulheres-sao-as-mais-impactadas-pela-mineracao/feed/ 0
O Crime da Braskem: a fraude do acordo de indenização https://www.mamnacional.org.br/2023/09/04/o-crime-da-braskem-a-fraude-do-acordo-de-indenizacao-o-crime-da-braskem-a-fraude-do-acordo-de-indenizacao/ https://www.mamnacional.org.br/2023/09/04/o-crime-da-braskem-a-fraude-do-acordo-de-indenizacao-o-crime-da-braskem-a-fraude-do-acordo-de-indenizacao/#respond Mon, 04 Sep 2023 17:15:03 +0000 https://www.mamnacional.org.br/?p=3616 A quantia de R$ 1,7 bilhão anunciada como indenização não contempla todas as áreas afetadas, ignora a instabilidade contínua do solo e não oferece transparência sobre a gestão do chamado "Fundo de Amparo ao Morador".

O post O Crime da Braskem: a fraude do acordo de indenização apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
A quantia de R$ 1,7 bilhão anunciada como indenização não contempla todas as áreas afetadas, ignora a instabilidade contínua do solo e não oferece transparência sobre a gestão do chamado “Fundo de Amparo ao Morador”.
Por Ananda Ridart 

No último mês, a Prefeitura de Maceió e a Braskem selaram um acordo que supostamente traria ressarcimento integral para os danos causados pela exploração de sal-gema na cidade. A cláusula 4.13 do acordo exime a Braskem de qualquer responsabilidade futura, colocando o ônus dos danos em cima dos ombros do município, mesmo que a mineradora seja condenada em processos futuros.

O acordo não contempla todas as áreas afetadas, a exemplo das ruas e imóveis que se encontram em isolamento da economia da cidade. Os bairros ainda continuam com instabilidade no solo e o acordo não considera a subsidência* da área, não houve relatórios para que a prefeitura afirme que o valor contempla os danos causados.

Para além disso, o mencionado “Fundo de Amparo ao Morador”, que pretende dar assistência às vítimas, tem gerado dúvidas para a população por não haver informações de como será gerido e custeado.

A mestranda em direito e moradora de Maceió, Rikartiany Cardoso, apontou com clareza as falhas desse acordo. Ela destacou que o prefeito bolsonarista Joao Henrique Caldas apresentou isso como uma vitória, enquanto ignora as necessidades reais da cidade.

“Isso é, no mínimo, um sinal de que o acordo está longe de proteger os interesses da cidade e de sua população. O acordo é um retrato do permanente e eficiente protecionismo empresarial no Estado de Alagoas, onde o silêncio das instituições de justiça é ensurdecedor. Este acordo não busca justiça, ele revitimiza aqueles impactados, potencializa os danos e enriquece o capital mineral na América Latina” comenta a alagoana.

Mais de 200 mil pessoas diretamente afetadas, além dos milhares afetados indiretamente, todas obrigadas a abandonar suas casas e comunidades. O trauma emocional, os prejuízos materiais e a incerteza sobre o futuro são constantes na vida desses moradores, que tiveram seu cotidiano transformado pela negligência de uma empresa poderosa.

Maceió desmoronada

Os problemas começaram quando os moradores do bairro Pinheiro relataram  o aumento dos danos estruturais logo após um temporal devastador em fevereiro de 2018. Com o passar das semanas, os estragos se multiplicaram, culminando no terrível abalo sísmico que sacudiu todo o bairro. Logo, fenômenos similares foram observados nos bairros vizinhos do Mutange e Bebedouro, afetando casas e vias públicas, e, posteriormente, se estendendo até o bairro do Bom Parto.

As investigações do Serviço Geológico do Brasil (SGB/CPRM) não tardaram em apontar a extração da sal-gema pela Braskem como a responsável por trás dos danos. O fenômeno foi classificado como “subsistência”, uma espécie de afundamento progressivo do solo devido a alterações no suporte subterrâneo.

O processo de mineração da sal-gema nas proximidades da Lagoa Mundaú, em Maceió, remonta aos idos da década de 1970. Antes mesmo da divulgação oficial do laudo pelo SGB/CPRM, já existiam cerca de 35 poços de extração, insistentemente dispostos em áreas urbanas. Apesar de esses poços estarem hermeticamente selados e sob pressão controlada, a volatilidade das crateras gerou estragos visíveis na superfície terrestre.

*Movimento de uma superfície à medida que ela se desloca para baixo

Movimento pela Soberania Popular na Mineração

 

O post O Crime da Braskem: a fraude do acordo de indenização apareceu primeiro em MAM Nacional.

]]>
https://www.mamnacional.org.br/2023/09/04/o-crime-da-braskem-a-fraude-do-acordo-de-indenizacao-o-crime-da-braskem-a-fraude-do-acordo-de-indenizacao/feed/ 0