Três rodas de diálogo realizadas entre abril e maio de 2025 mobilizaram comunidades tradicionais, movimentos sociais, universidades e organizações populares do Maranhão para aprofundar o debate sobre os impactos da mineração nos territórios e fortalecer as articulações rumo ao II Encontro Nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), que será realizado em agosto, na cidade de Fortaleza (CE).
As atividades formam um ciclo de mobilização que tem reunido diferentes sujeitos e saberes — indígenas, camponeses, estudantes, professores, pesquisadores, lideranças populares — em torno de uma escuta ativa e da construção coletiva de alternativas ao modelo mineral imposto nos territórios. Os encontros realizados em Bacabal, na Terra Indígena Rio Pindaré (Bom Jardim) e na Ilha de Tauá-Mirim (São Luís) revelam não apenas os danos concretos provocados pela mineração, mas também a potência da organização popular para pensar outros caminhos possíveis, enraizados na vida, na memória e na resistência dos povos.
Saúde coletiva e soberania
Movimentos sociais e coletivos nacionais de povos do campo exercem papel propositivo e de controle social, bem como são fundamentais na execução das políticas públicas. A professora Elizana Monteiro, também da UFMA e militante do MST, destacou que “os impactos da mineração afetam a vida das famílias, ribeirinhos, assentamentos, aldeias e quilombos. Mas o encontro também nos trouxe o anúncio da resistência: a organização dos movimentos e a luta por uma política de mineração que respeite a soberania dos povos”.

UFMA – Campus Bacabal (MA) Roda de Diálogo: Educação do Campo, Saúde e Mineração. O encontro reuniu estudantes, professores e militantes para refletir sobre os impactos da mineração nos territórios e fortalecer os caminhos da educação popular como forma de resistência.
Para a estudante Délys Cristina, do curso de Ciências Agrárias da UFMA e militante do MAM, a roda de diálogo representou uma experiência formativa potente, ao promover a reflexão crítica sobre os impactos da mineração e evidenciar a articulação necessária entre educação do campo e movimentos sociais. “Esse espaço amplia nossa consciência sobre as formas de exploração presentes nos territórios e fortalece a construção coletiva do conhecimento. A gente se reconhece, compartilha vivências, estratégias e resistências. A licenciatura se fortalece com a presença dos movimentos, assim como os movimentos se renovam ao dialogar com a universidade e a formação docente comprometida com o campo popular”, afirmou.
Povos indígenas exigem respeito e protagonismo
No dia 22 de maio, na Terra Indígena Rio Pindaré, no município de Bom Jardim, aconteceu a roda de diálogo Povos Indígenas, Saúde e Mineração. Jovens, lideranças e organizações locais denunciaram os impactos da ferrovia Carajás e do avanço da mineração sobre seus territórios.

Aldeia Piçarra Preta – Terra Indígena Rio Pindaré (MA) Diálogo “Povos Indígenas, Saúde e Mineração”. Em um espaço de escuta e partilha, comunidades indígenas debateram os impactos da mineração em seus modos de vida e os desafios do cuidado em saúde nos territórios.
Djalma Guajajara fez a acolhida do encontro, alertando sobre a poluição do ar, do solo e das águas provocada pelas locomotivas de minério, que afetam diretamente a saúde das comunidades e suas formas de sustento. “Nossa roça, nossas frutas, nosso rio — tudo está sendo contaminado. E ainda falam em desenvolvimento”, denunciou.
A discussão também trouxe à tona a falta de transparência sobre a CFEM (Compensação Financeira pela Exploração Mineral) e a exclusão dos povos indígenas da gestão desses recursos. Lideranças como Pedro Guajajara defenderam que a comunidade se organize para acompanhar a aplicação desses valores e exigir que sejam destinados às políticas públicas nos territórios. A juventude indígena presente assumiu o compromisso de seguir aprofundando o tema em reuniões futuras.
Como parte do encontro, foi anunciada a criação de uma turma do programa AgPopSUS (Programa de Formação de Educadores e Educadoras Populares de Saúde), voltada à formação de educadores populares em saúde indígena, com atuação direta na aldeia.
Saúde coletiva ameaçada na Ilha de Tauá-Mirim
Encerrando o ciclo de atividades, no dia 28 de maio, a comunidade Jacamim, na Ilha de Tauá-Mirim (São Luís), recebeu a roda de diálogo Saúde e Mineração, organizada pelo MAM em parceria com a Fiocruz e a campanha Resex Já.
A Ilha de Tauá – Mirim é considerada o pulmão de São Luís, por resguardar uma biodiversidade que garante a qualidade da água, do ar e do solo, beneficiando toda grande São Luís.

Comunidade Jacamim – Ilha de Tauá-Mirim (MA) Roda de Diálogo: Saúde e Mineração na Resex. Moradores da região do Coqueiro/Portinho se reuniram para discutir os danos causados pela mineração e construir estratégias coletivas de defesa da saúde e da vida nos territórios tradicionais.
“Essa região, é importante para manter a qualidade de vida do ludovicense, mas infelizmente ela está conectada ao sistema de exploração do minério de ferro e alumínio do Pará, que escoada pelos portos de São Luís, que estão proxima a Tauá Mirim. Por isso tudo que acresce de mineração do Pará, acresce destruição ambiental aqui”, explica Márcio Zonta, militante do MAM no Maranhão.
O encontro foi marcado por fortes relatos de contaminação do solo, perda de alimentos, escassez de água potável e aumento de doenças respiratórias. Moradores e lideranças denunciaram os impactos da expansão portuária e das estruturas minerárias no entorno da ilha. “Hoje a gente planta e não colhe. A macaxeira não dá mais. Estamos perdendo nossa comida, nossa cultura e nossa saúde”, disse Franklin Martins, morador da região.
Durante o diálogo, também se discutiram estratégias de resistência e ações para fortalecer a organização comunitária. A cantoria que abriu os trabalhos simbolizou a união e a firmeza das famílias que resistem à expulsão silenciosa provocada pela contaminação e pela especulação.
O encontro também serviu para convocar a comunidade a se integrar à caravana rumo ao II Encontro Nacional do MAM, onde será realizada a Feira Cultural da Agrobiodiversidade. “Esse encontro não é só pra denunciar. É pra sonhar junto. Mostrar o que temos, o que somos, e seguir em luta por um modelo de mineração que respeite a vida”, afirmou Gracinha Donato da direção do MAM no Maranhão.
Resistência que nasce do território
As três rodas de diálogo fazem parte do projeto “Ampliação de Ações Voltadas para a Área de Mineração, Saúde e Territórios Impactados pela Extração Mineral – Fase IV”, uma parceria entre o MAM e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), por meio da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS).
Mais do que denunciar os impactos da mineração, essas atividades fortalecem os laços entre comunidades, reafirmam o protagonismo dos povos do campo e constroem caminhos para a soberania popular. No Maranhão, o futuro está sendo gestado pelas mãos de quem vive, cuida e defende seus territórios — com coragem, ancestralidade e compromisso coletivo.
Movimento pela Soberania Popular na Mineração
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